No XL Congresso Nacional dos Procuradores dos Estados e do Distrito Federal, o professor Heleno Torres foi um dos expositores, e o tema de sua palestra foi: “Constituição Financeira e orçamento público: princípio democrático e judicialização da política”. Para mais informações: http://www.congressoanapeparaiba.com.br/#
Por Heleno Torres – Revista Consultor Jurídico O Federalismo fiscal é, de modo induvidoso, um dos temas de maior expressão na atualidade do nosso constitucionalismo e que dominará a pauta política e jurídica dos próximos anos. A reforma tributária é o clamor de todos. Contudo, para reformar o sistema tributário na sua integridade, será igualmente imperioso reordenar os mecanismos de gastos públicos e de repartições de receitas no federalismo cooperativo brasileiro. Esta tarefa, porém, dificilmente poderá ser concretizada antes de uma reforma política profunda, que permita reequilibrar as forças políticas, a correlação entre capital e trabalho e o próprio pacto federativo, segundo os anseios e valores democráticos que animam os movimentos sociais que clamam por reformas. Os custos do Estado não cessam. Incluem-se aí os custos dos direitos fundamentais, os custos do intervencionismo e do desenvolvimento, o custo do federalismo, assim como de toda a burocracia estatal dos três níveis de governo, previdência e outros. Coube ao poder constituinte, e cabe à política, no exercício democrático do poder, o desafio de decidir sobre os meios de financiar o Estado. E a escolha da Constituição do Estado Democrático de 1988 foi a adoção de um federalismo cooperativo equilibrado, com distribuição vertical e horizontal de recursos no pacto federativo, como se vê nos artigos 145 a 169 da Constituição Federal. Um aprofundamento da experiência do federalismo que começou com a própria proclamação da República, a partir do Decreto 1, de 15.11.1889. Entrementes, colheu-me de irredutível surpresa entrevista a dois professores alemães publicada na ConJur do dia 25 passado, intitulada:Para juristas alemães, federalismo cooperativo pode funcionar no Brasil. Quer dizer, apesar de a Constituição de 1946 ter instaurado nosso “federalismo cooperativo” há quase 70 anos, foi necessário virem dois professores alemães para descobrirmos, oxalá, que poderíamos alcançar esse modelo. Nosso padrão cultural de dependência intelectual não tem jeito. E ouvimos deles o óbvio: o sistema alemão não é modelo para ninguém, muito menos para a democracia brasileira. De fato, é somente o 105º “melhor” sistema tributário. Em parte, meu caro Leitor, esta é uma evidência de que nosso atraso e subdesenvolvimento são preponderantemente culturais, como insistiu Celso Furtado. Ou como dizia o saudoso Ariano Suassuna, nossas universidades ensinam de costas para o Brasil. Não seria exagero dizer que o federalismo constitucional brasileiro sempre foi um federalismo assimétrico. Sim, temos um “pacto federativo” inacabado, dadas as tantas externalidades interjurisdicionais persistentes, por pressões políticas ou inações legislativas, incessantes litígios judiciais e ausência de adequada coordenação institucional. O jurista, porém, tem que ser um agente permanente de concretização do Estado Democrático de Direito, bem como da forma de Estado eleita pela Constituição. Deve-se a Proudhon (Do princípio federativo, de 1874) uma definição de “federalismo” que recorda a etimologia da palavra federal, que deriva de foedus, genitivo foederis, que quer dizer pacto, contrato, tratado, convenção. A partir desta base, define-o como “pacto” pelo qual um ou mais estados ou municípios obrigam-se recíproca e igualmente, uns em relação aos outros. Com isso, o federalismo opõe-se à hierarquia e à centralização administrativa e governamental. A questão que desafia a todos é saber se temos, concretamente, um “pacto federativo” real entre nossos 26 estados e o Distrito Federal, 5.565 municípios, integrados em 5 regiões, e se estes estão mesmo todos orientados e dirigidos para fins comuns: aqueles consagrados na Constituição. Estamos a ver litígios ostensivos de toda sorte. Basta lembrar dos recentes embates quanto ao aproveitamento das águas do Rio Paraíba do Sul, a repartição dos royalties do Pré-Sal, com destinação para a educação e saúde, a renegociação das dívidas dos estados ou os entraves quanto aos critérios que devem nortear a distribuição de recursos do FPE, dentre outros, são exemplos de uma guerra viva e silenciosa, que não cessa. Lembra Klaus Stern (Derecho del estado de la república federal alemana) que uma Constituição deve atuar promovendo a unidade. Esta será a tese de fundo que se pretende defender neste breve estudo, quanto à fundamentação do federalismo fiscal e sua função no âmbito do nossofederalismo. Daí a imprescindibilidade de construção do conceito constitucional de federalismo, mas como operar este propósito? O federalismo, pela força normativa da Constituição, na forma preconizada por Konrad Hesse, deve ser meio para preservar as autonomias dos estados e municípios, integrados em harmonia com os fins constitucionais do Estado Democrático, na permanente concordância prática entre fins e meios, especialmente os financeiros. Por isso, controles como aquele do artigo 52, XV, da Constituição Federal, que atribui ao Senado Federal poderes para “avaliar periodicamente a funcionalidade do Sistema Tributário Nacional, em sua estrutura e seus componentes, e o desempenho das administrações tributárias da União, dos Estados e do Distrito Federal e dos Municípios”, são de máxima importância para o federalismo fiscal e deveriam servir à identificação de externalidades, para rápida e eficiente correção. O federalismo é signo de identidade constitucional. Não se limita a ser modelo de repartição espacial das unidades federadas. Carrega consigo a missão constitucional de servir como forma de separação e limitação dos poderes do Estado-nação. E por ser forma do Estado e cláusula de identidade, o federalismo vêse afirmado sob rigidez constitucional máxima, na condição de “cláusula pétrea”, pelo artigo 60, parágrafo 4.º, I, da Constituição Federal. Apesar da origem como “federalismo oligárquico”, como bem relatam Victor Nunes Leal (Coronelismo, enxada e voto) e Raymundo Faoro (Os donos do poder), a Constituição vigente funda o vínculo federativo pela democracia e pela solidariedade, enquanto cooperação intergovernamental. Sempre bom registrar que as capitanias foram convertidas em Províncias por ato de D. João VI, de 28 de fevereiro de 1821, e mantidas pelo artigo 2º da Constituição de 1824. Ao longo dos períodos de Colônia e Império, foram muitas as formas de cobranças de tributos e de repartição de rendas, como relata-nos Liberato de Castro Carreira, no seu “História financeira e orçamentária do império do Brasil”, de 1889. Como, então, identificar o federalismo fiscal e sua importância nos elementos determinantes do federalismo? Alfred Stepan, Professor da Columbia University, no seu estudo “Federalism and Democracy”, classifica as federações em dois modelos: 1) come together, quando as unidades são independentes entre si, mas constituem uma federação com o objetivo de mútua defesa ou crescimento comum; e 2) hold together, para países onde a unidade é anterior à descentralização e a federação emerge para responder às demandas por autonomia das partes constituintes e evitar desagregações. Nosso federalismo, de fato, não se originou de um “pacto federativo” entre unidades soberanas, da vontade do povo ou de lutas internas, para unir partes distintas; mas da unidade que se viu mantida desde o período colonial, e a seguir com as províncias, como meras partições administrativas (tipohold together). Washington Luís, historiador e Presidente da República, em sua obra: “Na Capitania de São Vicente”, bem esclarece que a Carta Régia de doação das capitanias hereditárias não era mais do que um acordo pelo qual eram discriminados quais tributos, foros e direitos o capitão-donatário auferiria nessas terras; e quais o Rei reservava para a Coroa. Como exemplo, à Coroa seria devido um quinto de todas as pedras e metais preciosos extraídos, 100% do pau-brasil entre outros. Quanto à discriminação de Rendas Tributárias do Império, observa Antônio Roberto Sampaio Dória que esta só surgiu com a Lei 99, de 31 de outubro de 1835, com designação dos impostos pela hipótese de incidência, no total de 57 tipos impositivos. E foi assim que, a partir do Brasil Império, um Estado unitário, adveio a descentralização política, financeira e administrativa, pela conversão das capitanias em Estados autônomos, conforme o Decreto 1, de 1889 e o artigo 2º da Constituição de 1891. De fato, em 15 de novembro de 1889, o Brasil acordou unitário e dormiu uma federação, por um “federalismo de Decreto”. Não poderia ser diferente, pois, para a oligarquia daquela época, a federação jamais poderia significar “desintegração” da unidade nacional; tampouco confundir-se com opção revolucionária popular. Nesse contexto, o federalismo significava forma de permanência da unidade, além de ampliar os poderes da elite dominante, ao se converterem as províncias em estados. Na prática, como assinala Amaro Cavalcanti, no seu “Regime Federativo e a República Brasileira” (1899), a partilha de receitas resultou em uma das mais duras e injustas que a União poderia supor. Atribuia este fato às dificuldades econômicas e creditícias, mas também à partilha de receitas orientada fortemente pelo federalismo centrífugo que se implantara. Em 1926, com as reformas constitucionais da época, começam a surgir medidas orientadas à centralidade da União, em modo centrípeto, para assegurar melhor redistribuição com as unidades de menor poder econômico, bem como para atenuar as diferenças regionais e promover o desenvolvimento. Seabra Fagundes (no seu artigo “A expansão dos poderes federais”, 1970, p. 64) sintetiza, muito bem que as funções da Reforma era “pôr fim ao descalabro financeiro reinante em várias unidades federadas”, motivo pelo qual a reforma propunha que “interviesse a União nos Estados, cuja incapacidade para a vida autônoma se demonstrasse pela cessação de sua dívida fundada por mais de dois anos”. Por isso mesmo, e como resposta aos conflitos entre Estados nas décadas de 1920 e 1930, surge na Constituição de 1934, o prenúncio de um modelo defederalismo fiscal cooperativo, com participação em tributos de competências diversas, mas que nunca chegou a ser implantado. E a Constituição de 1937 não trouxe novidade ou qualquer avanço nesse sentido. Foi com a Constituição de 1946 que se ampliou a descentralização, inspirada na Carta de 1934, e passamos a ter o produto da arrecadação dos impostos federais compartilhados com estados e municípios, e aqueles estaduais com os respectivos municípios, como típico “federalismo fiscal cooperativo”. Mais tarde, dentro dos esforços das “reformas de base” do Governo João Goulart, no final de 1963, foi criada Comissão do Ministério da Fazenda com a tarefa de reformar o sistema tributário. Devido ao golpe militar de 1964, estes trabalhos somente foram concluídos com a Emenda Constitucional 18, de 01.12.1965, que mantinha as mesmas bases da proposta original do Governo João Goulart. Surgiram, assim, novos impostos, como o Imposto sobre Mercadorias (ICM) e o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), ambos com regime não-cumulativo. Foram criados os Fundos de Participação, de Estados (FPE) e de Municípios (FPM), bem como todo um sistema de partilha de receitas intergovernamentais. Mais adiante, a Constituição de 1967 manteve os avanços da Emenda 18, ao tempo que adota um forte cunho centralizador dos poderes da União, numa orientação centrípeta, inclusive para o federalismo fiscal. Chega-se, assim, à Constituição de 1988, ao instituir umfederalismo cooperativo equilibrado, coerentemente com os fins constitucionais do Estado Democrático de Direito, ainda que a prática não evidencie sua efetiva concretização. Diante deste quadro, vale indagar se ainda persistem influências que afetam nosso federalismo na atualidade. Não é novidade que o modelo de federalismo brasileiro foi haurido da experiência da constituição americana, e está repleto de residualidade e de vícios históricos de épocas precedentes. Nenhuma das opções federativas, entretanto, possui identidade com qualquer outra. Bem o diz Roque Carrazza (Curso de Direito Constitucional Tributário): “Os que buscam um conceito definitivo, universal e inalterável de Federação supõem, erroneamente, que ela, aqui e alhures, tem uma forma única, geométrica, recortada de acordo com um molde inflexível. Para estes, os Estados só são Federados quando se ajustam, como verdadeiras luvas, aos ‘arquétipos eternos’, cujas origens e contornos lutam por precisar.” Basta comparar países como Alemanha, Argentina, Canadá, Austrália ou México. As simetrias e assimetrias são presentes em todos os modelos. A evolução a partir da Constituição de 1934, dá mostras de distanciamento do modelo americano, ao tempo em que nosso federalismo fiscal passa decentrífugo, quando se privilegiava a autonomia das unidades do federalismo dual, para centrípeto, com o início da experiência de distribuição de rateio da arrecadação dos tributos federais com estados e municípios, na feição embrionária do nosso “federalismo cooperativo”, o que somente veio a consolidar-se com a Constituição de 1946. Não é certo dizer que na experiência americana vicejou algum federalismo cooperativista. Gilberto Bercovici igualmente refuta essa tese. A mitigação do regime dualista nos EUA foi fruto de Jurisprudência da Suprema Corte, que, em 1937, no período do “New Deal”, de Franklin Roosevelt, abriu espaço à aplicação de leis federais intervencionistas, com preferência no caso de conflito com as estaduais. Jurisprudência inclusive que tem sofrido várias alterações, a partir de 1995, em favor dos Estados. Uma evidência de erro de aproximação pode ser vista na suposição de que os Estados Unidos asseguram algum “federalismo cooperativo” de modo definitivo. Na obra “The price of federalism”, Paul Peterson, Professor de Harvard, após tecer críticas aos custos elevados com a estrutura e funcionamento do federalismo, além dos excessos da União após o New Deal, propõe o regresso à preferência pela autonomia, do “federalismo dual”, para que o federalismo fiscal possa atender às necessidades da população, proteção das liberdades e desenvolvimento em cada Estado. Na Alemanha, vige o princípio de distribuição de cargas, do artigo 104a, alínea 1, da Lei Fundamental, pelo qual a competência de gastos da federação e dos Estados segue competências específicas, com garantia de autonomia financeira para os estados. Neste, a solidariedade prepondera sobre a autonomia, com uma legislação uniforme e centralizada, salvo exceções expressas. A União legisla de modo exclusivo e vinculante. O federalismo brasileiro é formado pela união indissolúvel de estados, distrito federal e municípios, todos autônomos e fundados nadescentralização, enquanto medida de aproximação dos entes estatais às necessidades das pessoas e eficiência administrativa. Contudo, não se pode perder de vista a unidade nacional na realização dos fins constitucionais do Estado Democrático. E Pontes de Miranda, nos seus comentários à CF de 1967, questiona: “Quem diz federalismo diz descentralização. Quem diz descentralização diz federalismo?”. Não basta a descentralização para que se tenha federalismo. Por isso, com Aliomar Baleeiro, não se pode desprezar o princípio da unidade econômica nacional. Sem a centralidade financeira, a coordenação política enfraquece o cooperativismo e a capacidade redistributiva do federalismo fiscal; sem a descentralidade, os controles sobre gastos perdem qualidade. Régis de Oliveira, no seu recente livro “Gasto Público”, bem o diz: “o controle integra a estrutura democrática em que tudo deve ser público, por definição, e aberto à sociedade”. Por isso, somente a integração entre unidade nacional e descentralidade concorrem favoravelmente ao pacto federativo. E qual federalismo fiscal vê-se implantado em nossa Constituição de 1988? A descentralização fiscal necessita de competências tributárias, na forma de “rateio de fontes”, para serem exercidas pelas unidades, segundo os tipos impositivos dos fatos geradores dos tributos, vedada qualquer hipótese de conflito ou concurso de competências tributárias. Do nosso arquétipo constitucional, a União recebeu competências para impostos no artigo 153, os Estados, no artigo 155 e os municípios no artigo 156, ficando o Distrito Federal com os estaduais e municipais, por força do artigo 147, todos da Constituição. E as mesmas pessoas do federalismo podem instituir ainda contribuições de melhoria e taxas, por força do artigo 145, II e III. A este amplo leque de competências materiais, somam-se as competências para instituir contribuições de intervenção no domínio econômico e contribuições sociais gerais (artigo 149, da Constituição Federal), exclusivamente pela União. O campo residual da tributação foi mantido com a União para criação de novos impostos ou contribuições previdenciárias (artigo 154, I e artigo 195, parágrafo 4º da Constituição Federal), afora a competência extraordinária para impostos, em casos de guerra externa ou sua iminência, bem como empréstimos compulsórios, ordinários e extraordinários. Para realizar o dirigismo constitucional do desenvolvimento e redução das desigualdades sociais e regionais, tem-se a discriminação de rendas pelo produto, tema fundamental e que recebeu atenção de notáveis juristas, como Sampaio Dória, Rubens Gomes de Sousa, Amilcar de Araujo Falcão, Goffredo da Silva Telles Júnior e outros. Quanto à discriminação de rendas pelo produto da arrecadação, regras expressas dos artigos 157 a 161 da Constituição Federal dispõem sobre transferências obrigatórias de receitas e formação de fundos. Basicamente, há dois tipos de transferências: as constitucionais (que são automaticamente realizadas após a arrecadação dos recursos), as legais, definidas por leis da União, ou voluntárias, por convênios entre as pessoas políticas, como se verifica no caso do ITR entre União e municípios. As transferências tributárias constitucionais da União para Estados e Municípios podem ser classificadas em transferências diretas (repasse de parte da arrecadação de uma pessoa competente para efetuar a arrecadação para outra) e transferências indiretas (mediante a formação de fundos especiais). Afora estes, têm-se fundos de relevante importância e que integram o sistema constitucional, como fundos especiais, voltados à distribuição cooperativa dos tributos compartilhados. No federalismo fiscal horizontal, quanto aos Estados, as diferenças de alíquotas nas operações interestaduais do ICMS, a depender do destino das mercadorias, de 7% e 12%, operam verdadeira transferência de rendas entre os Estados. Ademais, 25% do ICMS são destinados aos Municípios, com diferenças fiscais entre capitais, além da própria forma de participação no valor adicionado do ICMS do respectivo Estado. Vale recordar aqui decisão do STF de 2008, de lavra do Ministro Ricardo Lewandowski, ao considerar inconstitucional qualquer redução da cota do ICMS destinado aos municípios, em virtude de concessões de incentivos fiscais. Prática recorrente entre Estados e que Régis de Oliveira denomina de “cortesia com chapéu alheio”. Diante desta síntese, emerge com clareza a forma mais evoluída de federalismo fiscal cooperativo equilibrado ao qual chegamos, para “promover o equilíbrio socioeconômico entre Estados e entre Municípios”, como aponta, com propriedade, Raul Machado Horta, no seu “Direito Constitucional”. A solidariedade é o princípio maior que informa esse sistema de financiamento entre os entes do federalismo cooperativo. Mais do que separação e descentralização, o federalismo deve ser meio de colaboração entre os centros de governo na realização dos objetivos comuns, como diz Enoch Rovira, na sua obra Federalismo y cooperación em la República Federal Alemana. De fato, a Constituição de 1988, ao definir nosso modelo de federalismo fiscal cooperativo equilibrado, propõe-se à realização daqueles elevados objetivos de desenvolvimento e de redução de desigualdades regionais e sociais, como mandam os artigo 3º e artigo 43, da Constituição Federal. Por isso, como destaca Gilberto Bercovici (Desigualdades regionais, Estado e Constituição), a solidariedade é o principal elemento de “legitimação políticoconstitucional do federalismo”. O Direito Tributário e a Constituição Econômica devem ser convergentes com as funções da Constituição Financeira, para possibilitar o equilíbrio entre a liberdade e os interesses individuais e os princípios que positivam a “justiça distributiva”. Nas economias em desenvolvimento, como a do Brasil, os impostos sobre o consumo, como o ICMS ou o IPI, desempenham papel relevante para redução de desigualdades de certas regiões, ao permitirem a alocação uniforme de recursos e harmonizar os preços, segundo as finalidades interventivas da decisão política. Externalidade que desvela os rumos dos sucessivos litígios vê-se no caso dos critérios de rateio do FPE, que não refletem a situação de vida das populações ou o estágio de desenvolvimento das regiões. Em 24 de fevereiro de 2010, o STF julgou procedentes as ações para declarar a inconstitucionalidade do artigo 2º da Lei Complementar 62/1989, mantida sua aplicação até 31 de dezembro de 2012. Não sobreveio lei nova, porém. Em vista disso, os estados somente tiveram assegurados seus repasses por força de medida liminar deferida pelo Ministro Ricardo Lewandowski, na Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão 23, em 24 de janeiro de 2013, ao estender os efeitos daquela lei por mais 150 dias. Sobreveio, então, a Lei Complementar 143, de 18 de julho de 2013, que igualmente já se encontra submetida a contestação, pela ADI 5.069, com relatoria do Ministro Dias Toffoli. A renegociação de juros com a União, e inflexões sem qualquer sensibilidade à transição entre dívidas anteriores e as posteriores à Lei de Responsabilidade Fiscal, é evidência de outra das mais graves assimetrias que prosperam. A proposta foi apresentada pelo próprio Executivo no início de 2013 e previa a troca do indexador das dívidas atuais, mas ainda permanece em tramitação. E, por fim, a mais complexa de todas as externalidades, por envolver um misto de razões legislativas, conflitividade intensa e ausência de qualquer coordenação política, que é a “guerra fiscal”. As necessidades de arrecadação crescentes para os entes menos favorecidos fizeram surgir a chamada “guerra fiscal” do ICMS, mediante concessões autônomas de incentivos fiscais, sem convênios autorizativos do CONFAZ. Tudo por uma concorrência fiscal justificada pela atração de investimentos, à míngua de um plano de desenvolvimento nacional desde a década de 80. Se a repercussão é gravosa sobre os estados concendentes afetados pela perda de recursos; ou por aqueles de destino das mercadorias, obrigados a reconhecer os créditos gerados; não é menos preocupante a situação dos contribuintes que vêem seus créditos glosados ou insenções canceladas, em inconteste insegurança jurídica. Neste caso, a deslealdade parece ser regra de convívio no federalismo fiscal. O recurso ao chamado veto player, tão bem estudado por George Tsebelis (no seu livro: Veto Players: How Political Institutions Work), é frequente, quando a decisão de certa matéria fica a depender da concordância necessária de algum ator político. A imposição de decisões unânimes no CONFAZ para concessão de incentivos fiscais, pela Lei Complementar nº 24/1975, é típico exemplo em que estados funcionam como “veto players” e inibem incentivos fiscais pela forma, e não pela qualidade do incentivo ou coerência com a responsabilidade fiscal. Urge a superação desse critério, com prevalência da análise da qualidade substantiva do incentivo sobre a mera forma (deliberação unânime). O momento pede ações e reformas. O êxito do nosso federalismo fiscal será sempre proporcional à capacidade de proteção das autonomias federativas, mas com forte crença na Constituição dirigente que nos guia, sem contrariedades às políticas nacionais de desenvolvimento e de reduções de desigualdades, com transparência, coordenação e responsabilidade financeira. Impõe-se também uma atitude de sensibilidade pelas demandas decorrentes da proteção dos interesses nacionais, em favor das empresas brasileiras, dos empregos e da tecnologia que integram nosso “mercado nacional”, como efetividade do artigo 219, da Constituição Federal: “O mercado interno integra o patrimônio nacional e será incentivado de modo a viabilizar o desenvolvimento cultural e sócio-econômico, o bem-estar da população e a autonomia tecnológica do País, nos termos de lei federal.” E tudo a concorrer para uma ampla discussão orientada ao aprofundamento do nosso federalismo cooperativo equilibrado. Eis os passos concretos para o avanço das reformas. E este tempo já começou. Resta a cada um realizar a sua parte. Enquanto não nos chegam as condições adequadas para a reforma do federalismo fiscal, a reboque da imprescindível reforma política, as unidades federativas e, especialmente a União, não se podem furtar ao dever de operar reformas da estrutura dos tributos específicos (ICMS, PIS-COFINS, IRPJ etc), mediante simplificação do modelo impositivo, da burocracia e dos procedimentos de cobrança. É chegada a hora de a Receita Federal, para além de órgão arrecadatório, recuperar sua função, abandonada há mais de 20 anos, de promover políticas fiscais consistentes e coerentes com as exigências da ordem econômica, sempre nos limites dos ditames constitucionais. Não é diferente o que se passa com as fazendas estaduais. A orientação política (neoliberal) que propugna por uma afirmação de “órgão de Estado” (e não “de governo”) para estas burocracias não as exime do dever de agir em favor da economia e da sociedade, que demanda, exige e impõe, democraticamente, o dever de reforma tributária. As resistências infundadas das burocracias não eleitas às reformas necessárias e urgentes já não podem prosperar, para que se possa construir um futuro para nosso País de maior competitividade, trabalho, crescimento econômico, menos conflitividade nas relações Fisco-contribuintes e aumento das receitas tributárias.
Professor Heleno Torres participou de painel no evento, a convite do INEJE – Instituto Nacional de Estudos Jurídicos e Empresariais e da FBT – Faculdade Brasileira de Tributação, em 21 de agosto de 2014, em Porto Alegre, RS, no Teatro do CIEE. O Fórum tem o objetivo de debater os seguintes temas: Tributação, Infraestrutura e Desenvolvimento; Tributação e Serviços Públicos: a relação entre a aplicação do montante arrecadado, a título de tributos, e a eficiência na prestação de serviços públicos; Tributação da renda, do patrimônio ou do consumo: qual é a mais eficiente, sob a ótica dos entes governantes?; Comparação entre IVA e ICMS: vantagens e desvantagens de um em relação ao outro; Imposto Único: uma realidade factível ou uma utopia?; Mercosul x Comunidade Europeia: estudo comparativo da tributação das duas Uniões Aduaneiras; Reflexões sobre a tributação no Brasil, nos últimos 25 anos; Transparência Fiscal. O professor ministrou palestra no painel “Tributação e Serviços Públicos”, com o tema “Os Modelos de Tributação Internacional e a Eficiência na Prestação dos Serviços Públicos.”Professor Heleno Tôrres participou do 1º FÓRUM INTERNACIONAL DA TRIBUTAÇÃO EM PORTO ALEGRE
O título da palestra foi “Segurança Jurídica na relação tributária”.
O professor Heleno Torres proferiu palestra no congresso, que foi realizado em Curitiba/PR, nos dias 06, 07 e 08 de agosto, promovido pelo Instituto de Estudos Tributários e Relações Econômicas Internacionais – IETRE, e teve como tema central “Tributação: Democracia e Liberdade”.
Para mais informações:
http://www.direitotributariodoparana.com.br/professores.html
O professor Heleno Torres participou, em agosto de 2014, das Jornadas Argentino Brasileñas de Derecho y Políticas Públicas na Argentina. Sua palestra teve como tema “Política e Direito nas escolhas públicas da atividade financeira do Estado Democrático de Direito” e foi realizada no dia 03 de agosto de 2014, domingo, ao 12h00.
Para mais informações:
http://hiria.com.br/agenda-de-eventos/jornadas-argentino-brasileiras/palestrantes.html
Por Heleno Torres – Revista Consultor Jurídico
A Constituição de 1988 acentua a força dirigente do Estado por meio de normas expressas e implícitas de intervencionismo estatal. Como diz Seabra Fagundes, este constitui “uma inelutável realidade no mundo hodierno”.1 De fato, os ordenamentos não podem prescindir dessa força intervencionista do Estado na economia.
Demonstra-o, com rara convicção de dados rigorosos e apurados ao longo de décadas, Thomas Piketty, ao dizer que a segunda conclusão que representa o coração do livro “O Capital no Século XXI” é de que não existe qualquer processo natural e espontâneo nos mercados que visem a evitar as desigualdades ou tendências desestabilizadoras de um modo durável.2 Desse modo, somente o Estado, segundo os valores constitucionais, tem os meios e as condições para realizar esta tarefa. Como se viu recentemente, na crise econômica internacional de 2008, somente os estados com instituições fortes puderam suplantar rapidamente suas dificuldades, mediante regulação e instrumentos eficazes para recomposição dos próprios mercados. E os meios projetados por Thomas Piketty são todos de ordem tributária, com aumento de tributos.
O Brasil, neste particular, tem se mostrado pioneiro e eficiente na luta para reduzir desigualdades sociais e eliminar a pobreza, sem apelar para criação ou aumento de tributos sobre a renda, a sucessão e o capital, como sugere Thomas Piketty. Por meio do orçamento e medidas constitucionais, programas de intervencionismo, políticas públicas e gastos obrigatórios com saúde e educação têm sido importantes instrumentos para assegurar ao povo o acesso a direitos sociais, bem-estar e qualidade de vida.
Resta saber como os tributos podem cooperar com esta função e quais os seus limites constitucionais.
A constitucionalização de valores e princípios da ordem social e econômica elevou ao patamar da Constituição formal o poderdever do Estado de realizar a tarefa de justiça econômica e social,3 mormente por meio de normas tributárias. A Constituição, ao atribuir a função intervencionista ao Estado, exige dos seus agentes o múnus de cumprir a tarefa de concretização da justiça distributiva, segundo os critérios e meios disponíveis, mas sempre em conformidade com os fins designados no texto constitucional.
A Constituição Financeira coloca à disposição da Constituição Econômica os mais variados meios de intervencionismo, como se pode verificar com o aumento de tributos, na criação de obrigações acessórias ou mesmo na exigência de regimes especiais.
Cumpre assinalar que estas medidas podem ser perfeitamente empregadas, desde que observados os princípios da ordem econômica, no que representam verdadeiras limitações ao poder de tributar, o que somente se vê afastado quando a intervenção não represente uma injustificada afetação aos direitos e liberdades econômicos.
Daí a importância da política na realização da escolha pública e dos meios necessários para cumprir estas tarefas. Como observa Gustavo Zagrebelsky, ao lembrar que a Constituição “es un orden objetivo previsto para limitar la inestabilidad de las voluntades”;4 se assim o é, não pode ser a “burocracia” força suficiente para capturar a decisão de escolha pública sobre alocação e distribuição de rendas com fatores de justiça. Esta função é exclusiva da “política”, segundo as escolhas democráticas dos agentes políticos, eleitos pelo “voto direto, secreto, universal e periódico”, como representantes legisladores, chefes do executivo entre outros.
A neutralidade tributária é uma quimera. A atividade financeira do Estado nunca foi neutra, nem aqui nem alhures. Todo e qualquer gasto público relevante ou ato de criação ou aumento de tributo é intervenção direta e indireta sobre a macro e a microeconomia de uma nação, a modificar o volume da renda total disponível ou a distribuição de rendas. A simples instituição ou cobrança de qualquer tributo, por si só, já projeta consequências na ordem econômica. Os fenômenos de percussão, repercussão econômica, incidência econômica e difusão, tão bem examinados por Paul Hugon, na sua obra O imposto,5 dão mostras desses efeitos.
Na atualidade, está consolidado na Teoria da Constituição Econômica que a estrutura econômica da sociedade capitalista, sob o pressuposto da propriedade privada, não pode funcionar sem o intervencionismo do Estado. Por isso, feneceram, uma a uma, as teorias liberais que apregoavam a eliminação (neutralidade) ou redução ao mínimo da atuação do Estado na economia, como se o Estado Social fosse determinado pela economia, e não pela Constituição. A economia de mercado reclama segurança jurídica para seus agentes, mas esta pode ser ineficaz se o Estado não assegura a permanente “proteção” e controle do “mercado nacional”, inclusive com aplicação de regras de acordos internacionais.
Assim, qualquer modelo de justiça distributiva, na atualidade, reclama a presença do Estado, com seus múltiplos meios, inclusive da atividade financeira do Estado, a qual traz consigo a função de “planejamento” mediante as leis de orçamentos. É por esse motivo que, em múltiplas ocasiões, a Constituição Econômica é caracterizada, por alguns, pela ação de intervenção do Estado, exclusivamente, segundo certas funções estabelecidas em seu texto. Uma restrição material já superada no constitucionalismo brasileiro, como bem demonstrado nos estudos fundamentais do Professor Gilberto Bercovici.
É fundamental recuperar a percepção de Fábio Konder Comparato, para quem o Direito Econômico “surge como o conjunto de técnicas de que lança mão o Estado contemporâneo na realização da sua política econômica” (exemplos: os planos ou planejamentos), a compor uma ordenação jurídica sobre as estruturas do sistema econômico, mediante a atuação do Estado.6 E sua unidade estaria exatamente em “traduzir normativamente os instrumentos da política econômica do Estado”, ao que a Constituição Econômica presta-se como fundamental.
A Constituição Econômica, ao conferir a instrumentalidade aos particulares para agirem na economia segundo as regras preestabelecidas, assim como ao Estado, tem à disposição todo o aparato da Constituição Tributária e da Constituição Financeira para realização da Constituição dirigente, na direção do processo econômico geral.
Poderíamos utilizar uma miríade de exemplos para representar os meios à disposição da Constituição Econômica para o intervencionismo. Contudo, vejamos dois meios financeiros com essas finalidades interventivas ou dirigentes.
Decisão política muito criticada na oportunidade do seu lançamento, mas cujo êxito, após oportunos ajustes, é inegável nos dias atuais, pela atração efetiva de montadoras de veículos, melhoria da concorrência e expansão de postos de trabalho, foi a tributação diferenciada do IPI para carros importados por montadoras que não possuíssem unidade fabril no país, com o objetivo de estimular a competitividade, a agregação de conteúdo nacional, o investimento, a inovação tecnológica e a produção local.7
A Lei 12.546/2011 concedeu a redução da alíquota do IPI vinculada à qualificação da pessoa jurídica como industrial, o que ao mesmo tempo confere aumento do tributo a quem não tenha produção no País. A partir dessa lei, somente veículos importados por uma montadora com produção no País, estabelecimento industrial no Brasil, poderiam se beneficiar da redução de alíquotas, observados os requisitos de níveis de investimento, de inovação tecnológica e de agregação de conteúdo nacional.
Em relação ao ICMS e ao IPI, o princípio da seletividade tem como objetivo concretizar a capacidade contributiva, sendo o ônus tributário inversamente proporcional à essencialidade do produto, com franca possibilidade para a realização da extrafiscalidade. Quando os impostos perseguem uma função extrafiscal, o objetivo principal destes é atingir determinadas metas econômicas ou sociais. A proporcionalidade das alíquotas e a seletividade conformam as diferenças de tratamento ao longo das sucessivas operações das cadeias plurifásicas das mercadorias sujeitas à incidência do IPI.
Vejamos outro exemplo voltado a intervenções objetivas, por consenso, segundo medidas individualizadas.
As regras de defesa da concorrência contidas na Constituição Econômica têm como objetivo principal evitar abusos do poder econômico tendentes à dominação do mercado, à eliminação da concorrência ou que resultem no aumento arbitrário de lucros, em conformidade com os valores da proteção da livre concorrência e da livreiniciativa.
No exercício de sua função, o CADE possui poderes regulatórios e sancionatórios. Desse modo, ele tem autorização para reprimir práticas que violam a ordem econômica, tais como formação de cartéis, preços predatórios, acordos de exclusividade entre outros. Assim, tanto a atividade regulatória quanto a sancionatória, exercidas pelo CADE, devem estimular e difundir as práticas de concorrência leais.
O legislador, para que o CADE possa cumprir sua missão, colocou à sua disposição, entre outros instrumentos, o pagamento de contribuição pecuniária em favor do Fundo de Defesa dos Direitos Difusos (FDD), nos termos do artigo 85, parágrafo 1.º, III, da Lei 12.529, de 30 de novembro de 2011. É parte deste processo de intervenção, a saber:
“Art. 85. Nos procedimentos administrativos mencionados nos incisos I, II e III do art. 48 desta Lei, o Cade poderá tomar do representado compromisso de cessação da prática sob investigação ou dos seus efeitos lesivos, sempre que, em juízo de conveniência e oportunidade, devidamente fundamentado, entender que atende aos interesses protegidos por lei.
§ 1.º Do termo de compromisso deverão constar os seguintes elementos: (…)
III – a fixação do valor da contribuição pecuniária ao Fundo de Defesa de Direitos Difusos quando cabível.
§2°. Tratandose da investigação da prática de infração relacionada ou decorrente das condutas previstas nos incisos I e II do § 3.º do art. 36 desta Lei, entre as obrigações a que se refere o inciso I do § 1.º deste artigo figurará, necessariamente, a obrigação de recolher ao Fundo de Defesa de Direitos Difusos um valor pecuniário que não poderá ser inferior ao mínimo previsto no art. 37 desta Lei.”
O FDD, regulamentado pelo Decreto 1.306/1994, foi instituído pelo artigo 13 da Lei da Ação Civil Pública (Lei 7.347/1985), que trata das ações de responsabilidade por danos morais e patrimoniais causados a interesses difusos e coletivos, entre os quais se encontram os danos causados por infração à ordem econômica, entre outros.
A intervenção do Estado na economia, por normas tributárias ou financeiras (receitas), atua neste caso sobre agentes econômicos determinados, em detrimento de outros que atuem no mesmo mercado relevante, sempre que identificada a possível responsabilidade por provocar distúrbios concorrenciais, o que se apresenta como elemento de discrímen legítimo.8 Nessa hipótese, o pagamento de contribuição pecuniária ao FDD é legitimamente justificado, como condição inafastável para a aprovação de Termo de Compromisso de Cessão (TCC) pelo CADE, a revelar sua natureza de pagamento compulsório, obrigatório, mas em hipótese na qual o interessado pretenda pactuar um TCC, de modo espontâneo e consensual.
Diante disso, a contribuição pecuniária em tela não se confirma como sanção por ato ilícito, mas sim como condição para o exercício de um direito, uma obrigação legal, um verdadeiro pressuposto para a aprovação do TCC — mediante controle da atuação no mercado pelo CADE, em lídimo exercício de poder de polícia. A presente matéria coincide com o teor do artigo 78 do CTN, no que concerne aos requisitos de proteção das liberdades concorrenciais, além do mercado nacional, na forma de típico controle regulador.
Como se verifica, o exercício desse poder de polícia será tido como regularquando desempenhado nos limites legais, respeitados os direitos individuais, aplicado pelo órgão competente e com observância de devido procedimento legal.9
Pois bem, os pagamentos de contribuições pecuniárias são feitos em função do poder de polícia do CADE, exercido efetivamente. Traduzem-se em exercício de poder de polícia de forma preventiva. Como diz Maria Sylvia Zanella Di Pietro, entre os meios de que se utiliza o Estado para o exercício do poder de polícia estão “medidas preventivas (fiscalização, vistoria, ordem, notificação, autorização, licença), com o objetivo de adequar o comportamento individual à lei”.10 Não há dúvidas sobre a competência fiscalizatória da administração, no exercício de poder de polícia. Isto se dá diretamente pelo CADE e em seguida pelo pagamento de “taxa”, na forma de contribuição pecuniária e não como espécie de “multa” ou de “indenização” — na medida em que ainda não se verifica caracterizada a existência de “ilícito”, que assim a permita qualificar.
A natureza jurídica desta contribuição pecuniária é tributária, pois atende à descrição do artigo 3.º do CTN, como “tributo”. Trata-se de exigência com base legal previamente estabelecida (a), não se constitui em sanção a ato ilícito (b), reveste-se de prestação pecuniária compulsória, com limites mínimo e máximo definidos por lei (c), e como será devida ao FDD de forma compulsória, após a assinatura do TCC (d), será cobrada mediante atividade vinculada (e), até porque poderá ser exigida mediante típica “dívida ativa” federal.
O fato da denominação não a qualificar como “taxa” e a considerar como “contribuição pecuniária”, além da destinação do produto de sua arrecadação dirigir-se para órgão diverso (o FDD), um e outro são irrelevantes para afastar sua natureza jurídica tributária, como prescreve o artigo 4.º do CTN. É tributo, na forma de taxa pelo exercício do poder de polícia do CADE, nos termos do artigo 145, II, da Constituição Federal. A imediata indeterminação do critério quantitativo ou a sujeição daqueles que estão submetidos a um processo administrativo tampouco pode criar resistências a tanto. Basta lembrar que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é pacífica ao admitir que as custas judiciais, pagas pelos interessados para o exercício do direito de ação, têm natureza jurídica tributária e se classificam como “taxas”.
Aplicados esses pressupostos ao tema sob exame, confirma-se que acontribuição pecuniária é verdadeira taxa, decorrente do exercício do poder de polícia pelo CADE, órgão responsável pela aprovação do TCC, como forma de controle e não de atividade sancionatória, como pode ocorrer com a multa aplicada ao final do processo. A taxa decorre do ato administrativo da aprovação do TCC. E aqui está o seu fato jurídico tributário. Deste emanará a prestação pecuniária e compulsória: ou seja, do fato de o interessado obter TCC aprovado pelo CADE, em virtude do exercício de poder de polícia individualizado, este se vê obrigado ao pagamento da respectiva taxa.
Portanto, a contribuição pecuniária ao FDD é o típico instrumento financeiro de intervencionismo, como condição para o exercício do direito ao TCC, na realização concreta de atuações diretas sobre a concorrência, que não se confunde com sanção a ato ilícito, por ser tributo, cobrada mediante atividade plenamente vinculada, logo, na forma de verdadeira taxa, decorrente do poder de polícia do CADE.
Nesses casos, prevalece a Constituição Econômica, no cumprimento dos fins constitucionais do Estado, ao passo que os sistemas da Constituição Financeira e da Constituição Tributária são empregados como instrumentos fundamentais para o seu atingimento. O resultado fático de “extrafiscalidade” é a decorrência da interconstitucionalidade com a Constituição Econômica, cujo intervencionismo dirige-se ao cumprimento das competências constitucionais, com o objetivo de efetivar direitos fundamentais, promover o desenvolvimento ou proteger o mercado interno.
Nessas funções de dirigismo ou intervencionismo, o Estado tem ao seu dispor a atividade financeira para condicionar, modificar, fomentar ou desestimular as ações dos particulares. O intervencionismo jamais pode pretender dominar ou extinguir o mercado, mas acomodá-lo aos valores constitucionais, dentro dos seus limites e bases normativas. Como exemplo, não afeta o direito de propriedade, a igualdade ou a livreiniciativa a criação de receita pública ou de fundo especial que tenha como uma das suas destinações a redução da pobreza, como se vê nos artigos 82 e 83 do ADCT.
Os tributos cooperam para o intervencionismo da Constituição Econômica e, por intermédio dos meios normativos e funcionais da Constituição Financeira, como fundos, orçamentos e outros, são os mais importantes meios de atuação do Estado Social. Registre-se, porém, que o intervencionismo fiscal pode ser obtido com toda a atuação dos tributos, inclusive com suas formalidades e meios burocráticos.
Dentre outros, tem-se aquele empregado por obrigações acessórias, como exigência de controle sobre os sujeitos passivos. As “obrigações acessórias” são aquelas que, na forma do artigo 113, parágrafo 2.º, do CTN, consistem em um “fazer” ou “não fazer” algo em favor da fiscalização ou da arrecadação de tributos. Entretanto, nos últimos tempos, até mesmo estas tem sido empregadas com propósitos intervencionistas. E não se pode esquecer dos meios assemelhados a isenções e incentivos fiscais, como também das garantias, como as certidões negativas, sanções administrativas e outros. Todo o sistema tributário está à disposição da Constituição Financeira e da Constituição Econômica para que, pela interconstitucionalidade, o Estado Democrático de Direito possa ser efetivado.
Um exemplo poderia ser o uso da cassação da inscrição estadual do ICMS nos casos de desrespeito ao valor social do trabalho, princípio fundamental da “ordem econômica”, nos casos de atividades análogas à escravidão, como pode ser visto na Lei paulista 14.946, de 28 de janeiro de 2013, cujo artigo 1.º assim dispõe:
“Art. 1.º Além das penas previstas na legislação própria, será cassada a eficácia da inscrição no cadastro de contribuintes do imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação (ICMS) dos estabelecimentos que comercializarem produtos em cuja fabricação tenha havido, em qualquer de suas etapas de industrialização, condutas que configurem redução de pessoa a condição análoga à de escravo.
Art. 2.º O descumprimento do disposto no art. 1.º será apurado na forma estabelecida pela Secretaria da Fazenda, assegurado o regular procedimento administrativo ao interessado.”
Esta cassação da eficácia da inscrição do cadastro de contribuintes do ICMS implicará aos sócios, pessoas físicas ou jurídicas, em conjunto ou separadamente, do estabelecimento penalizado o impedimento de exercerem o mesmo ramo de atividade, mesmo que em estabelecimento distinto daquele; e a proibição de entrarem com pedido de inscrição de nova empresa, no mesmo ramo de atividade, pelo prazo de 10 anos, contados da data de cassação.
No constitucionalismo do Estado Democrático de Direito, o sistema tributário coopera intensamente para a realização dos fins de valores constitucionais do Estado, mediante obrigações principais ou acessórias, na construção do Estado Social na sua totalidade, inclusive como meio de intervencionismo estatal. Para tanto, a exigência de tributos deverá observar as limitações ao poder de tributar e, quanto à redistribuição, os princípios de bem-estar, dignidade da pessoa humana e solidariedade, afora os valores das ordens social e econômica.
As normas reguladoras do mercado, mediante a intervenção estatal normativa ou de atuação direta, devem ser informadas pelo princípio do Estado Democrático de Direito, a coibir os abusos do poder econômico e mitigar as desigualdades sociais ou regionais.
Uma aplicação da Constituição Financeira conforme os princípios e fins constitucionais do Estado, portanto, tem como função promover todos os meios necessários à plena e inarredável missão de desenvolvimento econômico e de bem-estar coletivo no âmbito nacional, segundo aqueles objetivos designados pela Constituição, numa perspectiva transformadora da realidade social e econômica em favor das gerações futuras, pelo compromisso intergeracional que se impõe a realizar.
1. Cf. SEABRA FAGUNDES, Miguel. Da nova ordem econômica na nova Constituição. In: CAVALCANTI, Themístocles B. et al (Coord.). Estudos sobre a Constituição de 1967 e sua Emenda n. 1. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1977, p. 168.
2. PIKETTY, Thomas. Le Capital au XXIe siècle. Paris: Seuil, 2013, p. 47.
3.$(ZAGREBELSKY, Gustavo. El derecho dúctil: ley, derechos, justicia. Trad. Marina Gascón. Madrid: Trotta, 1995, p. 99 e 101).
4.$$Ibidem, p. 94.
5.$$HUGON, Paul. O imposto. Teoria moderna e principais sistemas. São Paulo: Renascença, 1945, p. 74.
6.$ COMPARATO, Fábio Konder. O indispensável direito econômico. In: Ensaios e pareceres de direito empresarial. Rio de Janeiro: Forense, 1978, p. 465 e 471.
7. Falamos da Lei 12.546/2011, que previu a redução de alíquotas do IPI para veículos fabricados no País, mediante as seguintes condições:
“Art. 5.º As empresas fabricantes, no País, de produtos classificados nas posições 87.01 a 87.06 da Tipi, aprovada pelo Decreto n. 6.006, de 2006, observados os limites previstos nos incisos I e II do art. 4.º do DecretoLei 1.199, de 27 de dezembro de 1971, poderão usufruir da redução das alíquotas do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), mediante ato do Poder Executivo, com o objetivo de estimular a competitividade, a agregação de conteúdo nacional, o investimento, a inovação tecnológica e a produção local.
§ 1.º A redução de que trata o caput:
I – deverá observar, atendidos os requisitos estabelecidos em ato do Poder Executivo, níveis de investimento, de inovação tecnológica e de agregação de conteúdo nacional;
II – poderá ser usufruída até 31 de julho de 2016; e
II – poderá ser usufruída até 31 de dezembro de 2017; e
III – abrangerá os produtos indicados em ato do Poder Executivo.
§ 2.º Para fins deste artigo, o Poder Executivo definirá:
I – os percentuais da redução de que trata o caput, podendo diferenciálos por tipo de produto, tendo em vista os critérios estabelecidos no § 1.º; e
II – a forma de habilitação da pessoa jurídica.
§ 3.º A redução de que trata o caput não exclui os benefícios previstos nos arts. 11A e 11B da Lei no 9.440, de 14 de março de 1997, e no art. 1.º da Lei 9.826, de 23 de agosto de 1999, e o regime especial de tributação de que trata o art. 56 da Medida Provisória n. 2.15835, de 24 de agosto de 2001, nos termos, limites e condições estabelecidos em ato do Poder Executivo.
Art. 6.º A redução de que trata o art. 5.º aplicase aos produtos de procedência estrangeira classificados nas posições 87.01 a 87.06 da Tipi, observado o disposto no inciso III do § 1.º do art. 5.º, atendid1.º do art. 5.º, atendidos os limites e condições estabelecidos em ato do Poder Executivo.
§ 1.º Respeitados os acordos internacionais dos quais a República Federativa do Brasil seja signatária, o disposto no caput aplicase somente no caso de saída dos produtos importados de estabelecimento importador pertencente a pessoa jurídica fabricante que atenda aos requisitos mencionados nos §§ 1.º e 2.º do art. 5.º.
§ 2.º A exigência de que trata o § 1.º não se aplica às importações de veículos realizadas ao amparo de acordos internacionais que contemplem programas de integração específicos, nos termos estabelecidos em ato do Poder Executivo.”
8.$ “A Constituição, que declara o mercado interno como patrimônio nacional (art. 219), exige do Estado, como agente normativo e regulador da atividade econômica (art. 174), o exercício da função de fiscalização” (FERRAZ JUNIOR, Tercio Sampaio. Concorrência como tema constitucional: política de Estado e de governo e o Estado como agente normativo e regulador. Revista do IBRAC – Direito da Concorrência, Consumo e Comércio Internacional. V. 19. São Paulo: Ibrac, 2009).
9.$ BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 13. ed. São Paulo: Malheiros, 2001, p. 686.
10. DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 17. ed. São Paulo: Atlas, 2004, p. 113.
11. “II – taxas, em razão do exercício do poder de polícia ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição.”
12.$ ADI 3.694/AP, rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. 10.09.2006, Tribunal Pleno, DJ 06.11.2006, p. 30.
Entre os dias 25 a 27 de junho de 2014, ocorreu o “X Seminario de Derecho Constitucional Tributario en Iberoamérica”, na Cidade do México, que tratou na ocasião do tema:“Asignación de los ingresos tributarios y Control del Gasto Público”.
O professor Heleno Torres participou das ‘XXVII Jornadas Latinoamericanas de Derecho Tributario’ como palestrante no Seminário “Cláusula General Antielusiva”.
Para mais informações:
Por Heleno Torres – Revista Consultor Jurídico
Conjur
Todas as celeumas recentes em torno do “financiamento de campanhas eleitorais”, em grande parte, têm origem no descumprimento sistemático pelo próprio Congresso do regime de limites para as campanhas por partidos ou candidatos. De nada adianta toscos exercícios de vaticínios ou videntismos apocalípticos sobre o que gera mais ou menos corrupção no sistema eleitoral. Não é este o papel do jurista ou do homem público comprometido com as instituições do seu tempo. O certo é que o Congresso, que tem poderes para limitar gastos de campanhas segundos os cargos e as peculiaridades locais, até hoje, nunca exerceu esta competência.
E como o céu é o limite nos gastos atuais das campanhas políticas, somente empresas sedentas por negócios com o Estado são capazes de suportar os custos extravagantes das eleições políticas, a fomentar uma indústria gigantesca de sofisticados meios de difusão, mídia eletrônica e marketing, jornalistas e artistas remunerados a peso de ouro, comitês em regiões nobres, locações de aviões e todo tipo de meios de transportes, alimentação e formas várias de publicidade. Não é este o modelo de uma democracia que se pretende consolidar como participativa e adequada para atingir as melhores escolhas de quem decidirá os rumos do país.
A eficiência do sistema eleitoral será atingida ao escolher os quadros mais qualificados da política, e não aqueles dos candidatos mais ricos, individualmente, ou que sejam os mais hábeis na captação de riquezas. A culpa, definitivamente, não será do empresário, que financiará os candidatos conforme os critérios que julgar mais coerentes com seus interesses setoriais, ao menos enquanto vigora a permissão da lei. Tampouco se pode generalizar e semear desconfiança sobre todos os eleitos.
Resgatar a capacidade do sistema eleitoral de determinação da veracidade do pleito e da melhor escolha dos candidatos segue como o desafio da atualidade do nosso sistema eleitoral, para que os políticos com mandatos sejam evidências concretas de representatividade, e para que a democracia seja um princípio concretizado, não um valor simbólico. Se o país deseja mudanças, que os eleitores façam suas escolhas conscientes e responsáveis, pois disso depende a própria continuidade do Estado. Não são apenas campanhas que devem mudar, com redução de custos, mas a própria forma de compreender a função das campanhas eleitorais e o que delas se espera.
As campanhas políticas podem ter baixo custo, não ter qualquer empresa envolvida, e nelas campear a fraude e todo tipo de uso abusivo do poder econômico ou de qualquer outro meio de influência. Ilustra-o muito bem o excepcional documentário: “Porta A Porta – A Política Em Dois Tempos” (2009), do cineasta pernambucano Marcelo Brennand. Entretanto, o grau é muito diferente com o que se passa no nível das campanhas nacionais com financiamentos milionários, nos quais as chances de práticas de “rent seeking” ou demandas de “pork barrel”, dentre outras, são frequentes.
Quanto aos limites das campanhas, o artigo 17-A da Lei 9.504, de 30 de setembro de 1997, ao cuidar da “Arrecadação e da Aplicação de Recursos nas Campanhas Eleitorais”, prescreve que o Congresso deverá fixar até o dia 10 de junho de cada ano eleitoral o limite dos gastos de campanha para os cargos em disputa, observadas as circunstâncias locais. Contudo, “não sendo editada lei até a data estabelecida, caberá a cada partido político fixar o limite de gastos, comunicando à Justiça Eleitoral, que dará a essas informações ampla publicidade.” Com isso, o Congresso Nacional deixa de exercer sua função de árbitro dos limites financeiros das eleições, transferindo seus poderes para que os partidos o definam livremente.
Aparentemente, ao Tribunal Superior Eleitoral cumpriria uma burocracia de simplesmente dar “publicidade” aos limites fixados pelos próprios partidos. Na prática, porém, ocupa-se aquele tribunal da necessidade de regular os critérios e procedimentos a serem adotados, por meio do seu poder regulamentar, tão bem estudado por Manoel Carlos de Almeida Neto, no seu excepcional “Direito Eleitoral Regulador”. Desse modo, ainda que o TSE deseje manter-se deferente ao Congresso, a anomia na matéria impõe uma ação reguladora necessária, pela renúncia tácita aos limites de gastos para as eleições.
A lei deixa claro que sanções serão aplicadas sempre que possam ser provadas fraudes que resultaram em gastos superiores aos valores máximos de gastos declarados nos pedidos de registro de candidatos, pelos partidos e coligações, como prescreve o artigo 18, e cujo parágrafo 2º aduz que “gastar recursos além dos valores declarados nos termos deste artigo sujeita o responsável ao pagamento de multa no valor de cinco a dez vezes a quantia em excesso”. Diante disso, pela falta de fixação legislativa do limite das campanhas, tudo fica a depender do controle sobre os valores declarados.
Por parte da empresa que doa, porém, remanesce a preocupação quanto ao limite da respectiva doação, sobre o que pouco ou nenhuma segurança jurídica a ampara. Nesse particular, a ação de órgãos do Estado não poderia ser mais contraditória. Se fosse certa a argumentação — falsa por premissa — de que campanhas financiadas por empresas seriam o ideal e preferível para evitar “caixa dois” e ocultações, então a interpretação da lei não seria restritiva como tem sido, acompanhada de aberta perseguição aos doadores como se estes fossem agentes de crimes só por fazer doações a campanhas políticas.
Enquanto perdurar o regime legal autorizativo do artigo 81 da Lei 9.504/97, porém, deve-se aplicar o direito com justiça e rigores de segurança jurídica para aqueles que, com confiança jurídica no sistema, decidem contribuir, por ideologia ou por interesses.
Por conseguinte, urge que se empregue interpretação especificadora dos reais limites da lei eleitoral, segundo seus valores e princípios, sob a égide de um princípio de boa fé. Isto, sem prejuízo dos controles sobre eventuais ilícitos cometidos.
A definição do limite a ser doado por pessoa jurídica em campanhas eleitorais encontra-se no parágrafo 1º do artigo 81, da Lei 9.504/97, a saber:
“Artigo 81. As doações e contribuições de pessoas jurídicas para campanhas eleitorais poderão ser feitas a partir do registro dos comitês financeiros dos partidos ou coligações.
§ 1º. As doações e contribuições de que trata este artigo ficam limitadas a dois por cento do faturamento bruto do ano anterior à eleição.”
Destarte, o limite individual, por empresa, será aquele de 2% sobre ofaturamento bruto do ano anterior à eleição. Enquanto não concluído o julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade 4650, proposta pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, que visa a definir restrições ao financiamento de campanhas eleitorais (Leis 9.096/1995 e 9.504/1997), importa saber qual o conceito do termo faturamento bruto, que não se vê definido em lei “eleitoral”, mas tem sido buscado naquelas de caráter tributário, quanto ao PIS/Cofins, por se tratar de equivalente à sua base de cálculo, de forma absolutamente inadequada e conflitante.
Um exemplo do alcance deste problema é o crescente número de ações distribuídas no TSE que visam discutir as sanções relativas à superação do limite imposto pela Legislação Eleitoral, em casos de doação de pessoas jurídicas para o financiamento de campanhas. Essas ações chegam ao TSE, majoritariamente, com a pretensão discutir o conceito de “faturamento bruto”, já que a divergência doutrinária e jurisprudencial sobre seu conceito é manifesta. Essa discussão está presente em casos nos quais a pessoa jurídica sofre multa e outras medidas sancionatórias, por ultrapassar o limite imposto pela lei, seja por empresas de grupos econômicos e holdings.
A jurisprudência insiste em adotar a concepção de “faturamento bruto” como equivalente à de “receita bruta”, em paralelo ao regime do PIS/Cofins.
Segundo o artigo 81 da Lei 9.507/94, a fonte lícita da doação e a necessidade do efetivo recebimento da receita gerada pela atividade econômica da pessoa jurídica, em conjunto, definem a validade da doação. A Lei eleitoral, porém, não delimitou o conceito de “faturamento bruto”, que necessita ser construído a partir de outros com diferentes amplitudes, como Faturamento Bruto, Receita Bruta e Receita para fins contábeis.
Deveras, entre o conceito de “faturamento bruto” como simples soma algébrica de todas as “faturas emitidas” e aquele das contribuições ao do PIS/Cofins, preferível, este, mas unicamente para algumas empresas, segundo o setor de atuação, pela suposta “ampliação” para a noção de “receita bruta”. Ocorre, porém, que a legislação do PIS/Cofins traz uma série de restrições a receitas que compõem a base de cálculo, persistem regimes especiais de redutivos da base de cálculo e o próprio Supremo já reconheceu receitas que não a integram, como é o caso das “receitas financeiras”. Portanto, a seguir com esse critério, as injustiças serão sempre frequentes, em face da (i) contrariedade de valores que informam a lei tributária (base de cálculo deve ser especificada na lei) e a lei eleitoral (ao não fazer restrição, supõe-se que seja a noção contábil que informa a apuração do lucro da empresa), do (ii) caráter discriminatório sobre contribuintes e empresas doadoras, além de (iii) arbitrário, pois a lei eleitoral nunca determinou semelhante aplicação por analogia.
A confirmar este entendimento, o mesmo TSE, que já adotou conceito de “faturamento bruto” como relacionado com aquele de “receita bruta”, haurido do Direito Tributário para ser usado como critério de norma sancionatória do Direito Eleitoral, já fixou o entendimento segundo o qual as multas eleitorais não são de natureza tributária, tornando a equiparação dos conceitos ainda mais discutível.
Outro aspecto a se observar é a inexistência da expressão “faturamento bruto” na legislação das contribuições ao PIS e à Cofins, que estabelece apenas conceitos de “faturamento”, “receita” e “receita bruta”. Ao tempo que a Lei 9.507/94 refere-se a “faturamento bruto”, o legislador demonstra ter escolhido expressão com deliberada intenção de afirmar significado diverso daquele conceito entabulado pela legislação tributária. Destarte, não se justifica, com a devida licença daqueles que pensam de modo diverso, como é o caso de decisões do STF, que o conceito de “faturamento bruto” seja equivalente ao de “receita bruta”, inerente ao regime do PIS/Cofins.
Não há dúvidas que a segurança jurídica subjetiva impõe que sejam observados os princípios da boa-fé e confiança, assim como aquele do in dubio pro reu, que não podem ser abandonados, quando ilícitos são imputados a quem cumpre os requisitos materiais definidos na lei e demonstra que sob a égide da apuração contábil para determinação do lucro da empresa sua doação verifica-se no limite de 2% sobre o faturamento bruto do ano anterior à eleição.
Como dito, o termo “faturamento bruto” pode restringir-se ao mero “faturar”, que significa extrair faturas, ou ao somatório das diversas faturas, que corresponde à designação das mercadorias ou artigos vendidos, com a indicação da quantidade e espécie, além do respectivo preço. Seria este o sentido mais restritivo do termo.
De outra banda, Bulhões Pedreira define receita como a “quantidade de valor financeiro, originário de outro patrimônio, cuja propriedade é adquirida pela sociedade empresária ao exercer as atividades que constituem as fontes do seu resultado”. E prossegue: “Receita é valor financeiro cuja propriedade é adquirida por efeito do funcionamento da sociedade empresária. As quantidades de valor financeiro que entram no patrimônio da sociedade em razão do seu financiamento e capitalização não são receitas: na transferência de capital de terceiros a sociedade adquire apenas o poder de usar o capital; na de capital próprio adquire a propriedade de capital destinado a aumentar seu capital estabelecido”. Nesta vertente, as receitas podem ser derivadas do exercício da função empresarial ou de outras fontes, previstas para o custeio da atividade produtiva da empresa. No primeiro caso, se a empresa produz outro tipo de bem econômico, a sociedade vende ou fornece produtos recebendo em contraprestação “receita bruta” de venda de bens ou de serviços, enquanto valor financeiro cuja disponibilidade adquire com a venda dos bens ou prestação dos serviços.
O “faturamento” era utilizado como base de cálculo das contribuições para a se-guridade social, nos termos do artigo 195, I, ‘a’ da Constituição Federal, até a edição da Emenda Constitucional 20/98, que modificou o dispositivo constitucional para incluir o termo “receita”.
O “faturamento” tem campo semântico assaz diverso do conceito genérico de “receita”, o qual, inclusive, encontra-se positivado, abrangendo, além da receita obtida com a comercialização ou prestação de serviços — que são as chamadas receitas operacionais (artigo 187, III, da Lei 6.404/1976). Desde o julgamento da Ação Direta de Constitucionalidade 1, o STF delimitou que o conceito de faturamento cinge-se à receita de venda de mercadorias e prestação de serviços.
Contudo, a forma hoje utilizada pela Cofins e pelo PIS/Pasep contempla várias restrições à forma de apuração da base de cálculo, como as receitas financeiras propriamente ditas, ou seja, as auferidas pela pessoa jurídica em aplicações financeiras ou por meio de contratos de mútuo.
Em 2005, no julgamento do recurso extraordinário 346.084, houve amplo debate no Plenário do STF sobre o faturamento e sua ampliação pelo artigo 3º, parágrafo 1º da Lei 9.718/1998. Nesta oportunidade, pacificou-se o entendimento de que “faturamento” e “receita bruta” são sinônimos e referem-se exclusivamente às receitas de vendas de mercadorias ou prestação de serviços. Em novembro de 2013, ao analisar a base de cálculo das contribuições ao PIS e da COFINS, o STF reiterou o entendimento da jurisprudência consolidada naquela Corte e decidiu que “receita bruta” e “faturamento”, previs-tos no artigo 195, I da Constituição Federal antes da Emenda Constitucional 20/98, são sinônimos, como se vê na ementa do acórdão Agravo Regimental no Recurso Extraor-dinário 684.092-PR, pela relatora, ministra Rosa Weber:
“(…) O entendimento adotado no acórdão recorrido não diverge da jurisprudên-cia firmada no âmbito deste Supremo Tribunal Federal, no sentido de que receita bruta e faturamento são sinônimos, significando ambos o total dos valores aufe-ridos com a venda de mercadorias, de serviços ou de mercadorias e serviços. Precedentes. Agravo regimental conhecido e não provido.”
No final de 2013, em julgamento com repercussão geral, o STF decidiu também que o conceito de receita para fins tributários difere do conceito contábil. Para a incidência das contribuições sobre a totalidade das receitas, na forma do artigo 195, I da Constituição Federal após a edição da Emenda Constitucional 20/98, o conceito de receita é “o ingresso financeiro que se integra no patrimônio na condição de elemento novo e positivo, sem reservas ou condições”. E este é o motivo da nossa perplexidade com qualquer hipótese de equivalência entre estes modelos de aplicação da lei tributária com os valores e ausência de restrições previstas para a aplicação da lei eleitoral. São coisas distintas e inconfundíveis.
A noção de “faturamento bruto”, coetânea com a realidade das empresas doadoras, expressa-se pelo lucro apurado. E, nesse particular, apenas o conceito contábil e mercantil de “receita operacional bruta” pode ser adequado para equilibrar os valores de confiança e de segurança jurídica do doador com os princípios da legislação eleitoral. Esta forma de receita é ajustada pelas diminuições de patrimônio líquido, no item deduções da receita.
A Lei das sociedades anônimas (Lei 6.404/76), em sua “V Seção” distingue a receita bruta e a receita líquida, ao tratar sobre a Demonstração do Resultado do Exercício, nos seguintes termos:
“Art. 187. A demonstração do resultado do exercício discriminará:
I – a receita bruta das vendas e serviços, as deduções das vendas, os abatimentos e os impostos;
II – a receita líquida das vendas e serviços, o custo das mercadorias e serviços vendidos e o lucro bruto;”
A Lei 4.506 de 1964 dispõe sobre o imposto que recai sobre as rendas e proventos de qualquer natureza e, em seu artigo 44, define o conceito de receita operacional bruta e relaciona suas hipóteses, destacando o “produto da venda dos bens e serviços”:
“Art. 44. Integram a receita bruta operacional:
I – O produto da venda dos bens e serviços nas transações ou operações de conta própria;
II – O resultado auferido nas operações de conta alheia;
III – As recuperações ou devoluções de custos, deduções ou provisões;
IV – As subvenções correntes, para custeio ou operação, recebidas de pessoas jurídicas de direito público ou privado, ou de pessoas naturais.”
O conceito de “receita bruta operacional” reflete, assim, com melhor precisão, a capacidade econômica da pessoa jurídica, na medida em que alcança, como “faturamento bruto”, o resultado auferido nas operações de conta alheia; as recuperações ou devoluções de custos, deduções ou provisões; e as subvenções correntes, para custeio ou operação, recebidas de pessoas jurídicas de direito público ou privado, ou de pessoas naturais.
A lei eleitoral exige unicamente que doação seja proveniente de fonte lícita, identificável e que exista, efetivamente, a disponibilidade do doador sobre a quantia doada, para que dela possa dispor sem qualquer abuso de poder econômico, no limite de 2% sobre o faturamento bruto do ano anterior à eleição.
No caso do Direito Eleitoral, em contraposição ao Direito Tributário, deve prevalecer sempre a determinação da real disponibilidade econômica do doador, porquanto o doador deve ter provas de haver recebido, previamente, a receita gerada por sua atividade econômica e que possa dispor desta para a doação. Tendo em vista essa diferenciação de objetivos, o termo “faturamento bruto” contido no artigo 81 da Lei das Eleições deve ser interpretado segundo o conceito de “receita bruta operacional”.
Portanto, para os fins da Lei do Direito Eleitoral, com o intuito de aferir os limites de doação (previsto no artigo 81 da Lei 9.504/97), deve-se partir da efetiva capacidade do doador, sendo irrelevante que a receita seja ou não tributável. Logo, admite-se que os parâmetros informados à Receita Federal possam servir de índice para aferição do faturamento bruto da pessoa jurídica doadora; mas sempre com prevalência da “receita bruta operacional”, prevista na Lei 4.506/64, a partir de provas das empresas doadoras, para determinar o limite legal de faturamento bruto do ano anterior à eleição.
Durante a VIII Jornada de Debates da Fiscosoft o professor Heleno Torres proferiu palestra, cujo tema será “A aplicação dos Tratados para Evitar Dupla Tributação em face das regras da Lei 12.973/2014 e da jurisprudência dos Tribunais Superiores”. Para mais informações: http://www.fiscosoft.com.br/jornadajuridica/Texto a ser escondido
O Professor Heleno Torres participou de uma mesa de debate “Arbitragem: Arbitragem Tributária” no dia 30 de maio, das 14h30 – 16h00, no VI Encontro Nacional de Arbitragem e Mediação: Convivência e Antagonismo em Recife, realizado pelo CONIMA (Conselho Nacional das Instituições de Mediação e Arbitragem) e pela Centro de Arbitragem e Mediação (CAM-CCBC).
Para mais informações:
http://www.conima.org.br/wp-Content/uploads/2014/02/agenda_vi_enc_0702142031a.pdf
A questão suscitada delimita-se à aplicação do artigo 17 da Lei 11.033/2004, ao prescrever que: “as vendas efetuadas com suspensão, isenção, alíquota 0(zero) ou não incidência das contribuições PIS/PASEP e COFINS não impedem a manutenção, pelo vendedor, dos créditos vinculados a essas operações” (i). E, quanto às hipóteses de redução de base de cálculo, ao exame da possibilidade de o contribuinte utilizar-se dos créditos acumulados, na forma prevista no artigo 16 da Lei 11.116/2005 (ii).
A legalidade e a tipicidade das receitas que originam débitos e créditos das contribuições ao PIS e da Cofins definem um tratamento vinculante e objetivo, assim como aqueles casos excludentes do direito de assunção de créditos. Em vista disso, o direito ao crédito, expressamente previsto no artigo 3º, incisos I a X das Leis 10.637/2002 e Lei 10.833/2003, não pode ser reduzido por atos infralegais.
O modelo de não cumulatividade das contribuições ao PIS e da Cofins adota um rol positivo de fatos jurídicos que geram direito aos créditos, ao lado de outros que os excluem. Esses créditos estão, assim, previstos no texto da Lei 10.637/2002 e Lei 10.833/2003 (artigo 3º, incisos I a X) e somente poderão ser afastados (i) pela aplicação das vedações ao crédito (artigo 3º, parágrafo 2º das referidas leis) ou (ii) por lei posterior que os modifiquem, pela limitação de seu aspecto material, como fez o artigo 21 da Lei n. 10.865/2004.
De fato, quando o legislador pretendeu afastar o direito de crédito, o fez expressamente, como se verifica no artigo 3º, parágrafo 2º das Leis 10.637/02 e 10.833/03, que determina que operações de vendas (saídas) quando as precedentes (entradas) estão isentas, sem que isso possa afetar a não cumulatividade, a saber:
“Não dará direito a crédito o valor: (Redação dada pela Lei 10.865/04) (…)
II – da aquisição de bens ou serviços não sujeitos ao pagamento da contribuição, inclusive no caso de isenção, esse último quando revendidos ou utilizados como insumo em produtos ou serviços sujeitos à alíquota 0 (zero), isentos ou não alcançados pela contribuição. (Incluído pela Lei 10.865/04)”.
O princípio da não cumulatividade do PIS e da COFINS, como qualquer outro “princípio”, é espécie de norma jurídica vinculante na observância do seu âmbito normativo e, por isso, todo o ordenamento deve assegurar a sua efetividade e proteção (efeito de bloqueio) ou sua máxima efetividade. Esta capacidade de irradiação permite que o princípio expanda seus efeitos por infindáveis momentos docorpus jurídico; ao mesmo tempo, cabe a esse sistema assegurar a preservação do seu conteúdo essencial em todas as circunstâncias.
Nenhum direito é absoluto. Assim, uma vez conferido por lei o direito à dedução de créditos, demarcado segundo prévio catálogo de fatos geradores do referido direito, sobressaem duas repercussões: 1) estes critérios são delimitações do princípio de não cumulatividade, mas devem ser interpretados em conformidade com a máxima realização (efetividade) deste princípio constitucional; e 2) qualquer restrição somente pode ser oposta por lei, e desde que não macule o conteúdo essencialdo direito à não cumulatividade do PIS e da COFINS. Esta conclusão afasta, de pronto, a restrição ao direito de crédito por interpretações restritivas das autoridades administrativas, ao mesmo tempo que reconhece a limitação criada pelas leis com as hipóteses geradoras do direito ao crédito, não afasta da sua abrangência todas as hipóteses que com ela mantenham conexão, excetuada restrição legal expressa, insistimos.
Somente a lei pode trazer limitação ao direito de apuração dos créditos do PIS e da COFINS e qualquer restrição a direitos do princípio de não cumulatividade (garantia aos direitos de propriedade, capacidade contributiva, não confisco etc.) poderá ser justificada e legitimada, mas desde que não afete o conteúdo essencial do princípio. Daí a intangibilidade do conteúdo essencial, a reclamar suamáxima realização.
Por isso, mesmo quando o contribuinte realiza operações amparadas por benefícios fiscais, os quais tenham o condão de reduzir o valor do débito de PIS/COFINS, não poderá haver restrição à manutenção e utilização desses créditos acumulados, por se tratar de devolução dos cúmulos de tributos incidentes nas etapas anteriores da cadeia plurifásica. O direito à dedução dos custos e insumos legalmente autorizados das receitas brutas é decorrência direta e necessária do regime de apuração não cumulativo. Logo, uma vez adotado o método de apuração não cumulativo de base contra base (ainda que de forma imperfeita), pelo legislador, passa o contribuinte a ter o direito constitucional de dedução dos valores dos insumos e outros custos autorizados pela lei.
Em termos funcionais, a “restituição” de tributos, na forma de “créditos”,[1] consiste justamente no reembolso ao contribuinte das quantias pagas do tributo, apesar de sujeito à devolução futura, quando em presença do fato jurídico previsto em lei, como espécie de obrigação ex lege assumida pelo Estado.
A manutenção e o aproveitamento desses créditos, mesmo quando a saída não sofre incidência das contribuições (isenção, alíquota-zero e outros equivalentes, como a redução de base de cálculo), ao amparo do artigo 17 da Lei 11.033/2004 e do artigo 16 da Lei 11.116/2005, concorrem para a plena realização do princípio da não cumulatividade, pela garantia do direito subjetivo ao crédito decorrente das operações tributadas na entrada.
O direito ao crédito relativo ao tributo recolhido nas operações anteriores da cadeia é o motivo central para a existência da não cumulatividade. Quando esse direito não se encontra assegurado, o tributo converter-se em cumulativo[2]. Afastar o direito ao crédito implicaria a cumulação de incidências, o que se encontra vedado expressamente pela Constituição, ao reclamar a não cumulatividade.
Observa-se, portanto, que a isenção e a redução de base de cálculo – independentemente da sua conceituação – são, no âmbito da não cumulatividade, funcionalmente equivalentes no tocante ao desagravamento proporcionado, de modo a não obstarem o direito público subjetivo à devolução dos créditos de PIS/COFINS relativos a etapas anteriores da cadeia de plurifasia (operações de entrada).
Afinal, da mesma forma que a isenção (total) implica a redução do saldo devedor de PIS/COFINS, comparativamente àquele que seria devido na ausência da medida, também a redução de base de cálculo promove semelhante redução, ainda que em montante menor.
Corrobora-se, assim, para os fins da tomada de crédito do PIS e da COFINS, uma equivalência funcional necessária entre a isenção (total) e a redução de base de cálculo, porquanto esta funcionacomo uma isenção parcial.
A isenção total e a isenção parcial guardam entre si, no âmbito da sistemática cumulativa das contribuições do PIS e da COFINS, identidade funcional. A primeira – isenção (total) – impede, em última instância, a formação da obrigação tributária ou, ao menos, dispensa completamente o pagamento do tributo devido. A isenção parcial, por sua vez, implica no surgimento da obrigação tributária e do respectivo crédito que deverá ser pago pelo contribuinte. Nota-se, entretanto, que ambas as medidas têm o condão de proporcionar redução do saldo devedor de ambas às contribuições.
Destarte, como na sistemática não cumulativa da Contribuição ao PIS e da COFINS, a isenção (não incidência total) e a redução de base de cálculo (incidência parcial) produzem o mesmo efeito, qual seja, a minoração do saldo devedor nas operações de saída, com o consequente direito à manutenção de crédito vinculado às operações de entrada, assegurado pelo artigo 17 da Lei 11.033/2004, afirma-se como válida a conclusão da equivalência entre os institutos, cujo efeito há de ser a manutenção de créditos vinculados à operação alcançada por redução de base de cálculo, na proporção do montante reduzido.
É irrefutável a conclusão segundo a qual entre isenção e redução de base de cálculo afirma-se umaequivalência funcional no âmbito da não cumulatividade, a justificar a aplicação do artigo 17 da Lei 11.033/2004 sobre a parcela “reduzida”. Logo, a manutenção de créditos vinculados a vendas alcançadas por “isenção” deve ser também aplicado em relação à “redução de base de cálculo”, sob pena de frontal ataque aos princípios da não cumulatividade e à isonomia.
Ainda que não houvesse qualquer dispositivo legal expresso que assegurasse o aproveitamento de saldos credores da Contribuição ao PIS e da COFINS nas operações de saída com ou sem benefícios fiscais, este aproveitamento seria incontrastável, por ser inerente à realização da não cumulatividade constitucional, a qual não tolera restrição pelo legislador, a lembrar que o constituinte não lhe impôs nenhum óbice.
Nesse sentido, observa Paulo de Barros Carvalho:
“Diversamente do que ocorre com o ICMS, no que diz respeito à contribuição ao PIS e à COFINS, o constituinte não especificou o conteúdo, limites e extensão do princípio da não cumulatividade, deixando de pormenorizar o modo pelo qual o objetivo prescrito há de ser alcançado. Esse silêncio, no entanto, está longe de implicar total liberdade do legislador na implantação daquele primado. Ao contrário, a singela indicação da não cumulatividade como vector a ser seguido revela a amplitude do princípio, que não comporta restrição de espécie alguma, limitando sobremaneira a ação legislativa.
Por ocasião da disciplina da não-cumulatividade daquelas contribuições, à lei infraconstitucional é vedado restringir seu alcance ou extensão. Quando muito, poderá tratar dos deveres instrumentais necessários à concretização do princípio, como procedimentos para a constituição, registro e utilização dos créditos, bem como indicar os setores da atividade econômica sujeitos ao regime não-cumulativo, observadas as peculiaridades dos respectivos ciclos produtivos”[3].
Tem sido frequente, porém, a Fiscalização denegar o direito ao aproveitamento dos créditos acumulados, sob o fundamento de serem operações alcançadas por redução de base de cálculo, medida que, nominalmente, não estaria contemplada pelo artigo 17 da Lei 11.033/2004, ao rejeitar equivalência deste instituto com aquele da “isenção”.
Esta até pode ser considerada como uma “tese do Fisco”, mas que não encontra amparo em nenhuma lei vigente. Trata-se de um equívoco de interpretação literal, pois tanto pela não cumulatividade, que pressupõe a apuração de créditos das operações de entrada tributáveis (i), quanto pela equivalência entre a redução da base de cálculo e a isenção (ii), na parte “reduzida”, tem-se confirmado o direito subjetivo público ao aproveitamento dos créditos.
Logo, ainda que se defendesse a exclusão da “redução de base de cálculo” do campo semântico da “isenção”, como pretendido pelo Fisco, essa interpretação não elidiria a necessária devolução de créditos acumulados em decorrência da realização de operações favorecidas por redução de base de cálculo, como medida necessária à eficácia da não cumulatividade. Mormente porque não há regra expressa que determina esse impedimento. Antes, pelo contrário, o artigo 17 da Lei 11.033/2004 o autoriza, de maneira redundante.
Na presença de redução de base de cálculo, sempre será admitida a devolução dos créditos, quer pela parcela tributada, em virtude da incidência; quer pela parcela “isenta” proporcional, pela equivalência com a “isenção”, conforme o disposto no artigo 17 da Lei 11.033/2004.
Qualquer incidência tributária na “entrada” autoriza a apuração dos créditos, como já demonstrado, pela garantia da manutenção ser inerente à concretização da não cumulatividade. Quanto ao direito de compensação, temos dois regimes possíveis: a) a saída tributada permitirá a compensação ordinária dos créditos; e b) quando houver isenções e outros incentivos, como prescrito pelo artigo 17 da Lei 11.033/2004 e pelo artigo 16 da Lei 11.116/2005, deve ser a apuração do saldo para compensação ou ressarcimento.
A redução de base de cálculo atende a ambos os requisitos acima, uma vez que consiste, concomitantemente, numa hipótese de incidência (i) e na eliminação parcial do débito tributário (ii). E como quem pode o mais (isento), pode o menos (redução de base de cálculo), na afirmação do direito de manutenção do crédito no caso de isenção na operação de saída, a eficácia será idêntica. Por conseguinte, na parcela proporcional à redução, tem-se o equivalente de típica “isenção”. Eis o que denominamos de equivalência funcional entre redução de base de cálculo e isenção.
Nada justifica, portanto, a ilegal e inconstitucional restrição ao aproveitamento dos créditos acumulados das contribuições ao PIS e COFINS, por parte da Fiscalização. Diante da apuração de créditos nas operações de entrada, a compensação ou ressarcimento independe de as operações de saída serem tributadas, total ou parcialmente, como ocorre com a “redução de base de cálculo” (pela isenção sobre a parte reduzida).
De fato, mesmo quando a saída for não tributada, em virtude de isenção, alíquota 0 (zero) ou não incidência das contribuições, como prescreve o artigo 17 da Lei 11.033/2004, ainda assim persistirá a manutenção dos créditos. Destarte, na redução de base de cálculo, o efeito será equivalente ao creditamento integral, tanto pela proporção tributada quanto pelo percentual isento, como assim já reconheceu o STF[4].
Não obstante as diversas modalidades de benefícios fiscais, não há dúvidas de que estes guardam entre si equivalência funcional no âmbito da não cumulatividade do PIS e da COFINS, quando atuem no sentido de reduzir o “quantum debeatur” dessas contribuições. Ou seja, a incidência de norma tributária impositiva ou de norma veiculadora de benefício fiscal, na operação de saída, em nada afeta o direito à escrituração, manutenção e aproveitamento de créditos de PIS/COFINS, relativos àsoperações de entrada na cadeia plurifásica. Dessa maneira, ainda que o saldo credor seja superior ao montante do saldo devedor, a gerar um “acúmulo de créditos”, pela isenção, a devolução de tal saldo credor deverá ser assegurada, mediante ressarcimento ou compensação com o débito relativo a outros tributos.
Como assinalado, o princípio da não cumulatividade deve ser realizado em sua plenitude, de forma a não poder ser restringido pelo legislador infraconstitucional, sequer na hipótese de isenção (saída). Nesse sentido, rechaça-se o argumento segundo o qual isenção e redução de base de cálculo corresponderiam a institutos conceitualmente diversos, por terem sido ambos arrolados no artigo 150, parágrafo 6º da CF, a justificar expressa menção para que o direito ao crédito pudesse ser admitido, numa completa inversão de valores do ordenamento jurídico.
Heleno Taveira Torres é professor do departamento de Direito Econômico, Financeiro e Tributário da Faculdade de Direito da USP e advogado.
Revista Consultor Jurídico, 14 de maio de 2014
No dia 08 de maio de 2014, o professor Heleno Torres foi aprovado por unanimidade como novo titular de Direito Financeiro na Faculdade de Direito da USP, em concurso de provas e títulos. A homologação do concurso ocorreu no dia 29 de maio de 2014 pela Congregação da FDUSP e a sua nomeação se deu no dia 23 de julho de 2014, através de portaria do Reitor (de 22 de julho de 2014), publicada no Diário Oficial de São Paulo.
Confira a notícia:
http://www.conjur.com.br/2014-mai-09/advogado-heleno-torres-professor-titular-universidade-sao-paulo
Por Heleno Torres – Revista Consultor Jurídico
http://www.conjur.com.br/2014-abr-09/consultor-tributario-multas-tributarias-observar-constituicao
Não é novidade que as multas tributárias assumiram estágio de preocupação em toda a extensão do nosso ordenamento tributário, tanto no excesso dos valores cobrados, quanto na forma aleatória e pouco rigorosa com que são manejadas. Ora, todo o aparato sancionador tributário deve integral obediência aos princípios constitucionais de proteção do cidadão aplicáveis ao direito penal e processual em geral. Por esse motivo, urge reforma em torno do aparato sancionatório, que deve ser dotado de máxima efetividade, mas dentro de um modelo coerente com o Estado Democrático de Direito, na suportabilidade derivada da proibição de excesso (com aplicação decorrente da proibição de confisco), assim como da aplicação dos princípios de ordem penal, pela unidade do ilícito e da consequente proteção dos apenados em geral.
Basta pensar que a tipificação de “fraude” pode justificar denúncia criminal. Ora, não parece razoável admitir que justamente no processo administrativo tributário, no qual as obrigações assumidas independem da manifestação de vontade, ao acusado não se teria a aplicação dos mesmos princípios e critérios do processo penal, aos fins de defesa das sanções tributárias.
A administração tributária não tem qualquer privilégio ou liberdade para aplicar multas e imputar ilícitos aos particulares sem observância dos limites constitucionais, dadas as responsabilidades que vinculam qualquer agente de fiscalização ou julgador ao devido processo legal, como a presunção de inocência, o dever de provar o que alega, a publicidade e a motivação dos atos, bem como o respeito à ampla defesa.
No que concerne às sanções, o artigo 97, V do Código Tributário Nacional prescreve que somente lei pode estabelecer “a cominação de penalidades para as ações ou omissões contrárias a seus dispositivos, ou para outras infrações nela definidas”. A legalidade tributária é, portanto, requisito para a tipificação dos ilícitos e das respectivas sanções nos atos de aplicação de sanções, como atividade plenamente vinculada que deve obedecer as leis e os atos normativos infra legais vigentes. Os princípios penais nullum crimen sine legis e nulla poena sine lege também orientam o direito tributário repressivo, observados os paradigmas do necessário exame de culpabilidade.
A aplicação de sanções tributárias não tem qualquer fundamento inquisitório ou de cunho destrutivo ou confiscatório, ao tempo que está sujeita a limitações de natureza qualitativa e quantitativa, como leciona Sacha Calmon Navarro Coêlho. Deveras, não se pode afastar o exame da culpabilidade, que deve ser conhecida e apreciada porquanto intimamente relacionada à exigência constitucional de individualização das penas (artigo 5º, XLVI da Constituição Federal), a qual exige a verificação das características individuais do infrator quando da gradação da sanção. Mas não só.
Ao tempo em que o “auto de infração e imposição de multa” (lançamento com aplicação de sanções) traz consigo a pretensão punitiva estatal mediante aplicação de multas, algumas sobremodo severas, como são as multas agravadas, no caso de simulação ou na imputação de fraude, nestes casos, assume notável relevo o emprego dos princípios do processo sancionador, seja este administrativo ou judicial, principalmente aqueles do contraditório e ampla defesa, no exercício dos direitos inerentes ao devido processo legal (artigo 5º, LV, LIV, LVII, XLV, XLVI, da Constituição).
A razão não poderia ser outra senão aquela do papel que o processo administrativo envolve, como parte significativa da atividade sancionadora do Estado, preparatória do título executivo extrajudicial que poderá ensejar posterior execução fiscal ou sanções penais. Diante de tantas e significativas possíveis afetações ao direito de propriedade e liberdades dos indivíduos, a Constituição de 1988, ao instaurar um Estado Democrático de Direito, não poderia afastar do processo, inclusive o administrativo, a presunção de inocência e o dever de contraditório em todas as suas etapas.
O direito à defesa é a resposta da democracia contra os arbítrios do Estado, o que reclama efetividade plena, como norma constitucional a ser concretizada em todos os casos. Não basta “abrir prazo” ou dar direito de manifestação ao acusado para que se admita por satisfeito o direito à ampla defesa. Todas as suas provas devem ser consideradas e qualquer glosa ou exigência devem ser amplamente motivados, ao amparo da presunção de inocência, da prevalência do ônus da prova de quem acusa, mas especialmente com respeito ao princípio penal que protege o benefício da dúvida, o que não pode ser motivo para desqualificação dos atos praticados, para impor regimes mais gravosos, como arbitramentos e outros.
As garantias das provas e do dever de ônus da prova da Fazenda Pública (quem acusa) também são exigidas na conformidade necessária com a Constituição. A Administração Pública somente pode impor ao particular penalidades e cobranças de tributos com provas inequívocas dos fatos geradores (ao apurar a capacidade contributiva, no caso dos impostos) e dos ilícitos (ao provar a culpabilidade). Este é o mínimo de segurança jurídica do nosso ordenamento jurídico.
Quanto ao ônus da prova, impõe-se afastar prática assaz comum que afronta o princípio demoralidade administrativa, que é aquela de alegar provas genéricas ou insuficientes no auto de infração, a pretexto de satisfazer o ônus da prova da autoridade fazendária, mas que, ao fim e ao cabo, serve para “forçar” o contribuinte à produção de provas, numa espécie de inversão do “ônus da prova” ou de prova negativa.
As garantias de Direito Penal e de Processo que se encontram estabelecidas na Constituição são objetivas e dotadas de auto-executoriedade, logo, independem de lei que as regulamentem ou que lhes possa atribuir algum sentido material adicional. Portanto, aplicam-se incontinenti e sem restrições ao Direito Tributário, malgrado resistências normativas dirigidas a impedir a aplicação de normas constitucionais no processo administrativo fiscal.
Sabe-se, o artigo 26-A do Decreto 70.235/72, incluído pela Lei 11.941, de 2009, prescreve que “no âmbito do processo administrativo fiscal, fica vedado aos órgãos de julgamento afastar a aplicação ou deixar de observar tratado, acordo internacional, lei ou decreto, sob fundamento de inconstitucionalidade.” Mas tudo bem entendido. Aplicar a Constituição, in casu, garantias constitucionais do direito processual ou penal, nada tem que ver com afastar a aplicação ou deixar de observar lei ou decreto, sob fundamento de inconstitucionalidade. Lei nenhuma pode deixar de aplicar regra constitucional objetiva de garantia penal.[1] E, por conseguinte, não se trata de declarar “inconstitucionalidade” ou deixar de aplicar lei, quando na hipótese regra objetiva da Constituição deve ser aplicada, sem oportunidade para qualquer regulação por lei ou ato administrativo.
E, para os mais formalistas, a “lei” expressa não deixa dúvidas. O artigo 9º do Decreto 70.235, de 6 de março de 1972, sempre prescreveu que “a exigência do crédito tributário e a aplicação de penalidade isolada (…) deverão estar instruídos com todos os termos, depoimentos, laudos e demais elementos de prova indispensáveis à comprovação do ilícito.” Nesse particular, quer-se significar que o ônus da prova é exclusiva da Administração. Portanto, a Administração submete-se ao dever de presumir como verdadeiros os fatos contábeis registrados pelos particulares; e, para afastar essa presunção, é dever do Fisco provar, cabalmente, quais os lançamentos contábeis presentes nos Livros Fiscais que não mereceriam fé.
A garantia constitucional de que o acusado de qualquer ilícito tributário tenha direito à presunção da sua inocência[2] enquanto não se prove sua culpabilidade, com os meios necessários à defesa, envolve o dever da Administração de apurar, com isenção e cautelas, todas as provas apresentadas, sem qualquer inversão do ônus das provas, ao se manter o dever de provar o que pretende alegar. Ao converter o processo de apuração de provas em mera formalidade, o meio (lançamento) assume o papel de vil condenação, sem qualquer respeito à Constituição.
Cumpre à Administração, pois, carrear esforços para produzir provas necessárias e suficientes à demonstração da efetiva ocorrência do fato jurídico tributário, e, agindo assim, identificar, i) respeitados os direitos individuais e ii) nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte (artigo 145, parágrafo 1º da Constituição Federal). Decerto que a Administração não se limita pelas provas apresentadas pelo contribuinte, cabendo-lhe o uso do poder investigativo do artigo 195 do CTN, de diligências probatórias previstas na lei. Por isso, na construção dos seus argumentos, as provas devem ser irrefutáveis e suficientes para afastar quaisquer outras produzidas pelo contribuinte (o ônus da prova será sempre da Administração, e não do contribuinte).
E sempre que o contribuinte possua provas hábeis a justificar suas condutas, ao Fisco caberá ainda o ônus da prova para motivar o afastamento das provas do contribuinte. Nesse contexto, diante da insuficiência de provas para imputar o ilícito, ou quando o contribuinte logra antecipar documentos aptos ao afastamento do suposto ilícito, o agente da fiscalização deve assegurar ao particular apresunção de inocência, pois a dúvida ou a insuficiência não podem ter como consequência a “condenação”, pela lavratura de auto de infração com multas, adicionais de multas agravadas e imputação de ilícitos de fraude.
Em vista disso, o lançamento tributário deve descrever com clareza o motivo fático e legal, congruente com o conjunto probatório colhido pela fiscalização, de modo que não haja dúvidas entre a relação implicacional entre os instrumentos probatórios, que servem de elementos de convicção, e a construção do fato jurídico tributário. Este até pode ser um conjunto de indícios, mas desde que sejam graves, precisos e convergentes[3] para confirmar a ocorrência do fato jurídico tributário. Quando as alegações do contribuinte são tempestivamente prestadas, com adequação e transparência, e estas não são consideradas na motivação da autoridade fazendária na expedição da sua decisão, caem por terra, uma a uma, as garantias constitucionais do processo. Cedem ante o arbítrio do Estado. E, assim, o auto de infração, ato administrativo tipicamente acusatório, converte o lançamento tributário em instrumento inquisitivo e odioso.
Destarte, os princípios do direito de defesa, da presunção de inocência, do ônus da prova, vê-se, terão sempre cabimento nos processos administrativos relativos a autos de infração em matéria tributária. Contraria o Estado Democrático de Direito fundado pela Constituição de 1988 admitir uma aplicação do Código Tributário Nacional ou das leis processuais anteriores sem o filtro dos seus princípios. Logo, descumpre a lei tributária quem não observa a presunção de inocência e as garantias democráticas do contraditório e do dever de ônus da prova a quem acusa.
[1] NEDER, Marcos Vinicius. LOPEZ, Maria Tereza Martinez. Processo administrativo fiscal federal comentado. 3a Ed. São Paulo: Dialética, 2010, p. 417. “Súmula CARF nº 2: O CARF não é competente para se pronunciar sobre a inconstitucionalidade de lei tributária.”
[2] Cf. GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Presunção de inocência e prisão cautelar. São Paulo: Saraiva, 1991.
[3] LIMA, Marcus Vinícius Neder de. A jurisprudência do conselho de contribuintes do ministério da fazenda sobre planejamento tributário. Revista Internacional de Direito Tributário. n. 8, p. 129-138.
Heleno Taveira Torres é professor e Livre Docente do Departamento de Direito Financeiro, Econômico e Tributário da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP). Advogado.
Revista Consultor Jurídico, 9 de abril de 2014
Em 05 de abril de 2014 o professor Heleno Torres apresentou palestra denominada ‘Visão de um Jurista – Que deve ser alterado na Constituição Federal para que os Estados tenham autonomia administrativa e financeira?’ em um dos painéis do 15º Encontro do Fisco estadual Gaúcho.11Texto a ser escondido
O professor Heleno Torres participou do III Congresso Internacional de Direito Tributário do Rio de Janeiro, no dia 26 de março de 2014, no painel intitulado “Tributação dos lucros por coligadas e controladas no exterior. Cenário atual e futuro. A decisão do STF e a nova regulamentação, para pessoas jurídicas e físicas, e as emendas à MP 627/2013. A experiência internacional acerca da tributação de lucros do exterior” juntamente com os demais palestrantes: Roberto Duque Estrada, Conselheiro da ABDF/IFA Brasil e Advogado; André Martins de Andrade, Advogado; Agostinho do Nascimento Netto. Procurador Regional da Fazenda Nacional na 2ª Região; e o Presidente de Mesa, Gustavo Amaral, Conselheiro da ABDF/IFA Brasil e Procurador do Estado do Rio de Janeiro.
Para mais informações:
http://ifabrasil2014.com/programacao/
O Professor Heleno Tôrres esteve presente no coquetel de lançamento de sua obra coordenada, a Coleção Premium de Doutrina Tributária, no dia 17/03/2014 das 18h30 às 21h30 na Livraria da Vila | Alameda Lorena, 1731 Jardins | São Paulo | SP
Informações: (11) 3062-1063
Por Heleno Torres – Revista Consultor Jurídico
http://www.conjur.com.br/2014-mar-12/consultor-tributario-zona-franca-manaus-garantias-respeitadas
O Professor Heleno Torres participou, entre os dias 12 e 14 de fevereiro de 2014, das “38° Jornadas Colombianas de Derecho Tributario”, em Cartagena de Indias – Colômbia.
Nesta oportunidade, foi apresentado o Modelo de Convenção Multilateral bem como a proposta de Modelo Bilateral de Convenção para evitar a Dupla Tributação para a América Latina, do Instituto Latinoamericano de DerechoTributario (ILADT), elaborado como uma alternativa aos modelos da OCDE e da ONU.
Além do Professor Heleno Taveira Torres, o grupo de especialitas responsável pela elaboração da Proposta é formado por Pasquale Pistone (IBFD – Holanda), Jacques Malherbe (Universitè de Louvain – Bélgica), Natalia Quiñones (Colombia) e Addy Mazz (Universidad de la República de Uruguay).
Numa síntese, a elaboração das propostas de Modelos (bilateral e multilateral) de Convenção para Evitar a Dupla Tributação para a América Latina passou pelas seguintes fases:
– Na ocasião do 50° Aniversário da 1° Jornadas ILADT, a direção do ILADT resolveu propor um modelo ILADT para uma mais eficaz e moderna internacional dos países latino-americanos, com prevalência do regime de “territorialidade” ou da fonte, conforme a tradição da doutrina do ILADT.
– Após a aprovação pela Assembleia Geral, a Comissão redatora então constituída deu início aos seus trabalhos.
– Foi realizada a Apresentação dos conceitos fundamentais dos modelos (multilateral para América Latina; bilateral para relações com outros países).
– Apresentação dos primeiros estudos preliminares, apurados a partir de comparação de todas as convenções em vigor, e identificação do conteúdo do modelo multilateral.
– Apresentação do primeiro esboço completo do modelo multilateral de convenção para evitar a dupla tributação internacional.
– III Congresso internacional de Curitiba (promovido pelo IETRE)
– XXVI Jornadas ILADT de Santiago de Compostela (España)
– XXXVIII Jornadas ICDT de Cartagena (Colombia)
– XXVII Jornadas ILADT de Lima
– Apresentação do modelo bilateral à Assembléia ILADT para a aprovação, para que seja encaminhado aos países e organizações internacionais, juntamente com a proposta de modelo multilateral.
A Palestra foi proferida no XXVII Congresso Brasileiro de Direito Tributário, realizado pelo Instituto Geraldo Ataliba – IGA – Instituto Internacional de Direito Público e Empresarial (IDEPE), no dia 25 de outubro de 2013.
A palestra foi proferida no Congresso de Direito Tributário da OAB/DF, realizado pela Escola Superior de Advocacia da OA04B/DF, no dia 12 de setembro de 2013.Texto a ser escondido
Valor por Saul Tourinho
“Augusto, eu quero natural. Faz-me lembrar água de pote”, disse o ministro Castro Meira, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao garçom, antes de emendar: “Que saudade !”
Dia 22 de setembro, completará 70 anos, idade da aposentadoria compulsória. Hoje participa, pela última vez, da 1ª Seção, que aprecia matérias tributárias, cuja presidência já lhe coube.
O garoto de Livramento de Nossa Senhora, na Bahia, agregou elementos urbanos à sua personalidade sertaneja. Antônio, o pai, é farmacêutico, tendo se casado com Nair, já falecida: “Março é o mês de São José. Você vai se preparando para levar nosso filho para estudar em Salvador, se possível em colégio de padres, com internato”, ordenou dona Nair, ao marido. O plano era torná-lo médico. Para isso, era necessário estudar no Colégio Marista, em Salvador.
No dia da matrícula, no começo de 1959, Antônio estava com o bigode aparado, cabelo cortado, vestia um terno com elegante lenço no bolso. José Castro Meira vestia-se como o pai e o cabelo tinha o penteado de hoje. Após a matrícula, que exigia o pagamento adiantado dos três primeiros meses, o filho revelou suas intenções: “Não quero fazer o científico. Quero fazer o clássico”. O Marista não tinha o clássico, voltado para as disciplinas do vestibular de direito. O jeito foi desistir e partir para o Colégio Antônio Vieira. Antônio jamais viu a cor do dinheiro dos meses antecipados. O filho, contudo, estava feliz: “Era a escola onde estudou Hermes Lima”, observa o ministro, referindo-se ao jurista baiano que chegou à presidência do Supremo Tribunal Federal.
O investimento deu resultado. Em 1972, Castro Meira, aos 29 anos, era promotor de Justiça na Ilha de Itaparica. A promoção seguinte seria para Salvador. “Era quase o paraíso”, diz, queixando-se, porém, do marasmo. Para sair de Itaparica, tornou-se procurador da Fazenda, em Salvador. Em seguida, inscreveu-se no concurso para juiz do trabalho, mas a inscrição não foi aceita: “Era ditadura e eu tinha feito parte do Centro Acadêmico Rui Barbosa, de esquerda. Acho que pensaram que eu não podia mexer com sindicato e trabalhador”. Na companhia de dois amigos (Lisandro Tourinho Costa e Hélio Gil Gracindo), inscreveu-se no concurso de juiz federal: “Eu só levei o certificado do Ministério Público. Tinha seis anos de atuação. Fui aprovado, mas os colegas, não. São as coisas da vida”.
O ministro prossegue. “Quando era presidente do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, achava que já havia conseguido tudo. O tribunal abrangia praticamente todo o nordeste”. Contudo, “quando abriu a vaga para o STJ, os colegas acharam importante um sujeito vindo de onde eu vinha, disputar”.
“Eu conhecia a metade do STJ: Ari Pargendler, Fernando Gonçalves, Vicente Leal, Adhemar Maciel, José Delgado, todos ingressaram no segundo concurso para juiz federal”, diz.
A lista trazia, além de Meira, o então juiz federal Teori Zavascki e Plauto Afonso da Silva Ribeiro, na época, presidente do Tribunal Regional Federal da 1ª Região. Cabia a Fernando Henrique Cardoso a indicação. “Disseram-me que o Teori não iria, pois não conhecia a bancada. O Plauto era o favorito. Encontrei-me com Téo Vilela, Albano Franco, Jutahy Magalhães, lideranças de São Paulo, até mesmo o Aécio Neves”. Em 2002, quase na véspera de Natal, o indicado aparece: era Teori Zavascki. “Disseram que ele não conhecia a bancada. Acontece que o Teori tinha o Nelson Jobim, que era mais do que uma bancada”.
Depois, o ministro integrou uma nova lista. “Dessa vez, na companhia do Plauto novamente e do Manuel Lauro de Castilho. Era o governo do PT. Disse para o meu filho: Eu não conheço ninguém do PT. Ele, sabiamente, respondeu: Mas será que eles não lhe conhecem?”. Daí em diante, repetiu o périplo, com outros personagens. Marcelo Déda, governador do Estado de Sergipe, desempenhou papel importante. Meira é cidadão sergipano e aracajuano. Em Aracaju, ia aos jogos de futebol com os filhos, na companhia de Ayres Britto, posteriormente indicado ao STF: “Eu e o Britto assistindo o jogo e imaginando que o Sergipe era o melhor time de futebol que existia”, afirma. “Falei com o Fernando Schmidt, que atualmente é o presidente do Bahia. Falei também com o Paulo Souto, cujo pai, Carlos Souto, foi juiz e desembargador oriundo de Rio de Contas, uma cidade próxima à minha. Procurei o Wellington Dias, do Piauí, que era próximo ao Presidente Lula”. Em 4 de junho de 2003, José Castro Meira tomou posse no STJ, sendo o primeiro ministro nomeado pelo presidente Lula para o tribunal.
Meira retoma o fio da meada: “Eu sabia que não seria presidente do STJ. Não tinha como. Eram muitos, antes de mim. Na verdade, eu não me achava em condições sequer de chegar aqui”, disse. “Livramento tinha menos de cinco mil habitantes. Não havia comunicação. Eu não possuía figuras ilustres na família, pelo menos na área do direito. Olho tudo isso como uma benção de Deus. Era algo completamente fora dos meus limites”.
Sobre os advogados que atuam no STJ, observa: “São excelentes. Há doutores, autores de livros. Humberto Ávila, que escreveu sobre princípios, é um exemplo. Arruda Alvim, também. Há as revelações jovens”.
Em seguida, menciona um, em especial: “O Heleno Torres me escapou. Eu era juiz federal e disse a ele que deveria entrar na carreira. Trocávamos correspondências enquanto ele estava na Itália. Ele chegou a fazer uma das provas e foi aprovado. Mas depois me avisou que iria para São Paulo. O concurso demorou, porque havia muitos recursos e ficavam numa tertúlia acadêmica. Quando eu tive notícia que o Heleno começava a crescer na advocacia e no magistério, eu sabia que ele não daria sequência às outras fases do concurso. Dito e feito! O importante é que, hoje, o Brasil tem um jurista brilhante”.
Em pouco mais de uma semana, o ministro Castro Meira estará aposentado. O plano é descansar até o fim do ano. Seu próximo lar fica num condomínio nos arredores do Recife, Pernambuco. O futuro advogado, contudo, revela: “Sou péssimo em cobrar honorários. Quando comecei a advogar, em Paramirim, eu me apaixonava pela causa e me esquecia de cobrar. Zé Lages, um amigo, me perguntava: ‘Meira, tá cobrando quanto?’”, diz, recordando-se do sábio rábula que advogava graças a alvarás expedidos pelo juiz da cidade.
“Quero uma advocacia sem estresse. Algo que me permita fazer atividades físicas e manter minha alimentação saudável”, afirma, enquanto nos despedíamos com um aperto de mãos.
A temporada no STJ é, para o ministro, um emaranhado de recordações sentimentais. “Amadureci muito”, diz. Na porta de saída do gabinete, antes de me ver partir, perguntei se ele havia sido feliz no STJ. Com um discreto sorriso no rosto e a mão sobre a maçaneta, respondeu: “Fui feliz toda minha vida, não só no STJ”.
O Professor foi nomeado através da Portaria n° 493/13/PR, expedida pelo Presidente da OAB – Seção de São Paulo – Marcos da Costa, em 30 de julho de 2013 e tomou posse como Membro Consultor da COMISSÃO DE DIREITO ADUANEIRO DA OAB/SP no dia 26 de agosto de 2013. Texto a ser escondido
Professor Heleno Torres em entrevista a rede Globo no programa Bom dia Paraíba em 13 de agosto de 2013.
Sindireceita em 08/08/13
A presidenta do Sindireceita, Sílvia de Alencar, participou, na manhã de ontem, dia 7, da abertura do Seminário “O novo regime de previdência complementar do servidor público”, promovido pelo Fórum Nacional da Advocacia Pública Federal. O evento foi realizado no auditório da Associação Nacional dos Procuradores da Previdência Social (ANPPREV) e contou com as presenças do presidente do Fórum, Heráclio Mendes de Camargo, do diretor presidente da FUNPRESP-EXE, Ricardo Pena Pinheiro, do senador Rodrigo Rollemberg (PSB/DF), do subchefe de Análise e Acompanhamento de Políticas Governamentais da Casa Civil da Presidência da República, Luiz Alberto dos Santos e de vários especialistas no tema, representantes de entidades sindicais além de servidores públicos federais.
Na presença de autoridades, associados, dirigentes, e servidores públicos, o presidente da associação, Antônio Rodrigues, a coordenadora do evento, Meire Monteiro Mota Coelho, e o presidente do Fórum, Heráclio Camargo, realizaram a abertura dos trabalhos compostos pelas palestras dos especialistas na área previdenciária, como o diretor-presidente da FUNPRESP-EXE, Ricardo Pena, além dos convidados Jaime Mariz de Faria Júnior, Luiz Alberto dos Santos, Wagner Balera, Heleno Taveira Torres e Delúbio Gomes Pereira da Silva.
O Sindireceita também foi representando no evento pelo diretor da DEN, Sérgio de Castro. O seminário “O novo regime de previdência complementar do servidor público” foi realizado em parceria pelas entidades que o compõem o Fórum que são: ANAJUR (Associação Nacional dos Membros das Carreiras da Advocacia Geral da União), ANPAF (Associação Nacional dos Procuradores Federais), ANPPREV (Associação Nacional dos Procuradores da Previdência Social), APBC (Associação dos Procuradores do Banco Central do Brasil), APAFERJ (Associação dos Procuradores Federais do Estado do Rio de Janeiro) e SINPROFAZ (Sindicato Nacional dos Procuradores da Fazenda Nacional).
O Professor Heleno Torres foi designado através da Portaria n° 246/2013, pelo Presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, em 17 de junho de 2013.
O Professor Heleno Torres apresentou a Conferência de Abertura da 47ª. ASSEMBLEIA GERAL DOCIAT – Centro Interamericano de Administraciones Tributarias, que se realizou em Buenos Aires, Argentina, entre os dias 22 e 25 de abril de 2013.
A organização da 47ª Assembleia do CIAT foi levada a cabo pela Administración Federal de Ingresos Públicos de Argentina – AFIP e teve como tema central os “ASPECTOS DE LA TRIBUTACIÓN INTERNACIONAL QUE AFECTAN EN LA GESTIÓN DE LAS ADMINISTRACIONES TRIBUTARIAS”.
Síntese do Perfil Técnico apresentado pela Organização: “La liberalización del comercio y la movilización de los factores de producción (capital y trabajo) continúan caracterizando a la economía mundial. Como consecuencia de ello las operaciones económicas transfronterizas de los contribuyentes se incrementan cada vez más, incluso en las economías menos desarrolladas. Con el fin de proteger sus bases imponibles, este fenómeno ha llevado a los gobiernos a adoptar cambios en sus ordenamientos jurídicos –incrementándose las posibilidades de una Doble Imposición Jurídica Internacional (DIJI) para los contribuyentes– y a buscar una mayor cooperación y asistencia mutua entre las Administraciones Tributarias (AT) para prevenir la evasión fiscal internacional.”
TEMÁRIO:
Tema 1: Doble imposición, evasión fiscal internacional y Convenios de Doble Imposición – CDIs Subtema 1.1. Normativa interna para prevenir la evasión
Fiscal internacional
Subtema 1.2. Aplicación efectiva de las cláusulas anti-abuso de los Convenios para evitar la Doble Imposición – CDIs
Subtema 1.3 Análisis costo – beneficio de los Convenios de Doble Imposición – CDIs
Tema 2. Control de los precios de transferencia
Subtema 2.1 Métodos específicos para el control de los precios de transferencia
Subtema 2.2 Sectores de interés: casos prácticos
Subtema 2.3 APAs – Arreglo anticipado de fijación de precios, BAPs – Arreglo bilateral anticipado de fijación de precios, MAPs – Arreglo multilateral anticipado de fijación de precios.
Tema 3: Intercambio de información y asistencia administrativa mutua entre las ATs
Subtema 3.1. El Intercambio de información
Subtema 3.2 La fiscalización y cobranza en el exterior
Subtema 3.3 Implementación efectiva de Unidades de Intercambio de información y de tributación internacional